top of page

A NOVA foi de ERASMUS à terra da falta de bom senso

E levou na mala meia dúzia de ideais plastificados, uma vontade difusa de mudança e um  mapa onde o destino final é sempre o conforto.  Foi com ar de quem sabe muito e vive pouco, embriagada em certezas sobre sistemas que mal  compreende, e com uma língua afiada para criticar o mundo, mas incapaz de se cortar ao espelho. 

Aqui, reclama-se da carga horária como se os corredores da universidade fossem minas  de carvão, mas mal aparece um professor que exige mais do que a média, que trata o ensino como  uma entrega humana e não um serviço de catering académico, que é imediatamente acusado de  ser vaidoso, antiquado ou opressor. 

Não se quer aprender, quer-se passar. Quer-se um diploma com aplausos, currículos com tachos  e quotas sem espaços.  

Se o professor exige, é arrogante, se não exige, é desleixado. E no fim, é sempre o sistema que  falha, nunca a preguiça do estudante. 


Curioso também é o compromisso político. 

Denuncia-se o racismo institucional com frases copiadas de artigos que nunca se leram até ao  fim. Grita-se contra o machismo, contra o classismo, contra o capitalismo, tudo com a confiança  de quem nunca teve de enfrentar verdadeiramente o que denuncia.  

E, no entanto, os mesmos que aplaudem estas palavras são os que votam sempre nos mesmos, os  que se emocionam com o discurso bonito e esquecem o vazio por trás. Lutam com emojis.  Revoltam-se com partilhas. Mas, quando chega o momento de levantar a voz, de encarar um  colega, um professor, um dirigente, quando chega a hora de dizer: “Isto está errado” calam-se.  Calam-se por medo. Calam-se porque nunca o disseram antes. Porque, é mais fácil ser corajoso  num texto que começa com um “Desculpa, alguma coisa” do que perante algo que possa ser  verdadeiramente constrangedor.  


Veneram a negligência, desde que ela venha com carisma. Acreditam em causas, desde  que não impliquem desconforto. E, se num domingo à noite quando o mundo lhes aparece no  ecrã, numa guerra, numa tragédia, num escândalo…sentem algo. Sentem, sim, mas sentem como  quem vê um filme triste. Comovem-se, mas não se movem. Suspiram, mas não agem. Sofrem  durante dois scrolls e depois voltam ao vídeo do cãozinho. 

São rápidos a comentar o erro do árbitro, o VAR, o penálti mal marcado…aí há paixão,  há força, há convicção. Mas são lentos, muito lentos, quando se trata de enfrentar a mediocridade  real. E não é que não saibam falar. Sabem falar muito bem. Sabem indignar-se. Sabem citar.  Sabem teorizar. Só não sabem agir. Ou não querem. Porque a ação exige corpo. E o corpo, esse,  está colado à cadeira, à desculpa, ao medo de falhar. 


E o moralismo académico não falta, condenam o consumo, a exploração, o trabalho  mecânico, com a solenidade de quem nunca pegou numa esfregona.  

Há pena, sim…pena quase poética, por quem estuda e trabalha, mas nunca desejo de ser como  eles. Quer-se liberdade, quer-se autonomia, mas sem largar o cordão umbilical dourado da mesada  mensal. Vivem, por isso, esmagados por uma culpa vaga por ainda dependerem dos pais, mas  recusam, no seu estoicismo folgado, a rotina do operário, o suor do salário, o horário picado.  Porque isso, é indigno. Porque isso é outro mundo. E esquecem que esse mundo os espera… no  fim do curso, ou no fim da ilusão. 

O mundo onde ninguém lhes vai perguntar o que pensam, mas sim o que sabem fazer.

E ainda, criticam tudo, a estrutura, os professores, o curso, o país, o mundo… mas não  mexem uma vírgula do que podem mudar. Não exploram, não questionam a sério, não vão ver  com os próprios olhos. Falam de bolhas, mas nunca saem da sua. Falam de opressão, mas  recusam-se a cair. Porque cair exige coragem. E coragem, aqui, é o mesmo que dizer que te vais  candidatar a uma lista.  


Aqui, prefere-se o sarcasmo à entrega. Prefere-se parecer lúcido a ser vulnerável. Prefere-se  criticar quem tenta do que tentar com medo de falhar. 

Vivem numa bolha decorada a slogans, onde se repete a performance da consciência sem  nunca a sentir. Patos mimados num lago morno, com as penas bem arranjadas e o ego bem polido,  que preferem dar voltas em círculo do que arriscar o salto para o desconhecido. O desconhecido  assusta. O real assusta. O compromisso, por sinal, também assusta. 


Não vivemos num jardim. Vivemos num palco. Num cenário pintado com luzes LED  onde as flores são compradas em centros comerciais e os protestos são feitos com likes. Aqui, ninguém quer ver, quer ser visto. Ninguém quer mudar, quer parecer transformador.  

A NOVA não foi de ERASMUS. Fugiu de si. Fugiu da frustração que dói e preferiu a  revolta que entretém. E mesmo lá longe, entre conferências e selfies, o espelho vai junto. E ele ri se. Ri-se de quem grita por justiça, mas não a pratica no dia-a-dia. Ri-se de quem exige escuta,  mas não sabe ouvir.  

E ri-se, acima de tudo, de quem sabe tudo sobre o mundo, menos sobre si.



 
 
 

Recent Posts

See All
Carta Aberta ao Ambientalismo Vazio

Se esta é a ressonância da nossa geração, então precisamos urgentemente de afinar a frequência. Queremos ressoar com os jovens, mas o eco...

 
 
 

Comments


deixa-nos uma mensagem, fala connosco!

obrigado pela tua submissão!

© 2025 Jur.nal - Jornal Oficial dos Estudantes da Faculdade de Direito da Universidade Nova de Lisboa

bottom of page