Canção do Mar
- Pedro Miguel Silva
- Mar 20, 2022
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Poesia
É triste a canção do mar
Que à noite, instante, me chama;
Narra momentos ao luar
Afundados já na lama.
Escuto-a num banco d'areia,
Não longe da escura costa;
Assim me encanta e desgosta,
Solidão feita sereia.
Está no marulhar das ondas,
Que vão e vêm tranquilas
Em indiferentes sibilas
Ante verdades hediondas.
Está na brisa leve e lassa,
Que segreda ao mar parado
Os infortúnios e o fado
De uma anunciada carcaça.

É calmaria traiçoeira
Que me quer pôr fim à viagem.
Traz-me ao limiar da voragem,
A uma funesta soleira.
Malévola melodia,
Rumorejando mentiras
Por um manto de safiras
A um ser em agonia.
Pede-me para mergulhar,
Sob a impávida lua,
Na água cálida e nua
Que não quis ainda esfriar;
Para que nela desvaneça
Tudo o que de mim existe,
Sem saber o que subsiste,
O que em mim arde e não cessa.
Não será ainda afogado,
Caído nas profundezas,
Depois de tantas empresas,
O meu ser no mar salgado;
Sinto os ventos de mudança,
Por fim frescos e risonhos,
E retomo os cem mil sonhos
Daqueles tempos de criança.
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