A vida está cheia de grandes questões… aquelas que nos roubam horas de sono, que nos fazem dar voltas e voltas e empurrar os lençóis para fora da cama, que nos inquietam nos momentos mais inesperados e nos mais previsíveis. Tantas incertezas e tantas dúvidas, tantos gritos sem resposta e olhares sem correspondência. Tantos campos por preencher. Passamos os nossos supostos melhores anos nesta grande reviravolta, a questionar o que sabemos e o que ainda nos falta aprender, a tentar assimilar todo o conhecimento possível para sairmos pela porta e conquistarmos o mundo que queremos para nós… apenas para chegar à conclusão de que sabemos muito menos do que duvidamos. Duvidamos muito mais do que sabemos. Fingimos entender e engolimos as nossas agonias até à nossa hora mais sozinha, a hora em que somos só nós e a nossa parte mais pura, a hora em que todo o teatro é desmontado e só restam os nossos pensamentos. A hora em que nos apercebemos que, por muito que nos esforcemos, há coisas que nunca vamos perceber, há dúvidas que vão sempre persistir, e por muito que pensemos que conseguimos chegar ao resultado, o amanhã está a chegar com mais questões. Ontem, eu sabia responder ao que quer que me perguntassem e hoje nem levanto a mão. Ontem, eu era a primeira a entrar e hoje tenho medo de passar pela porta. Ontem, eu escalei uma montanha e hoje nem sei andar.
Que filosófico, mais uma (semi) adulta que não sabe que raio anda aqui a fazer, mais uma adolescente (fora do prazo) que não entende a gramática da vida, que não consegue construir uma frase sem ponderar o uso de cada palavra. Mas será que a mudança de uma palavra mudaria o que quer que seja? Será que faria assim tanta diferença? Porque é que passamos horas a pensar nas palavras certas, a escrever e reescrever a nossa história, se elas nada alteram? E de que nos servem os dicionários se metade delas continuam indecifráveis? Se o contexto as muda completamente? Se simplesmente não são sentidas? Quando era mais nova entregaram-me um dicionário, mas nunca me deram um manual para compreender todo o peso que as palavras carregam, todos os seus diferentes significados e todas as suas emoções. Ontem, eu li todas as definições e hoje elas já não faziam sentido. Ontem, eu escrevi um livro e hoje fiquei sem palavras. Ontem, eu sabia tudo e hoje já não sei nada. As alterações são tão constantes e os destinos são tão finais. Se os objetivos do ser humano estão tão definidos pela sociedade, porque é que raio é que são tão difíceis de alcançar, porque é que cada vez que nos aproximamos eles se afastam mais um pouco? Porque é que tudo o que eu hoje sei amanhã é mentira?
Que agonia constante que é viver. Nunca saber o que está certo, nunca saber por que caminho ir e nunca saber o que vem depois da curva. Tantas incertezas e nenhuma solução, tantos passos dados em vão e tantos que parecem ter propósito, espero que sim. Esta narrativa, que nos persegue, de que a vida é uma caminhada para um momento em que finalmente vamos ser felizes, em que vamos ter o emprego certo e a casa certa e a família certa e tudo vai fazer sentido. Esta mentira em que nós acreditamos para dar um propósito aos anos que cá passamos e que, pelo menos, tentamos concretizar. Como se não olhássemos para o mundo à volta e víssemos que todas as pessoas que é suposto estarem nesse momento da sua vida continuam a ter dúvidas e continuam a lutar contra todas as incertezas pelas quais todos nós passamos. Então digam-me porque é que continuamos a acreditar? Porque é que continuamos a fingir que todo o sofrimento atual será recompensado com uma vedação branca e três cães a correr? Porque é que continuamos a fingir que a relva será mais verde do outro lado? Porque é que nos pressionamos tanto com uma fantasia? Com uma falsa ideia de final feliz de Hollywood?
Que crise existencial. Eu também não sei responder. (Acho que nunca vou saber)
Mas essa também é a beleza da vida, não temos de saber porque é que estamos a dar um passo para o dar, não temos de saber porque é que queremos falar para o concretizar, não temos de perceber o que estamos a fazer e porque é que o estamos a fazer para efetivamente o executar. Às vezes temos só de continuar. Eu tenho mil dúvidas e algumas nunca serão respondidas e claro que isso é incrivelmente assustador e angustiante e me faz querer esconder na cama até que alguém apareça com um livro com todas as respostas. Mas, na realidade, isso nunca vai acontecer. Nunca chegaremos ao ponto em que temos certezas (também não sei se as queremos ter, talvez o mistério seja o ingrediente principal da nossa existência, tal como o momento mais entusiasmante de qualquer beijo é a sua inesperada correspondência) e nunca chegaremos ao ponto em que isso não nos vai incomodar, em que conseguimos sair de casa seguros de que tudo será igual quando voltarmos... não vai ser… cada momento que vivemos altera completamente toda a nossa existência e todas as nossas noções. Mas temos de continuar a sair de casa, certo? Temos de continuar a viver, não podemos só sucumbir às nossas dúvidas e dizer que por agora chega. Não, porque não há botão de pausa, só há uma grande continuidade incerta que nos pode trazer as maiores tragédias, mas também as maiores alegrias. É por isso que temos de continuar. É por isso que continuamos, porque, independentemente de tudo o resto, ao final da curva pode estar o melhor beijo da nossa vida, ao final da estrada pode estar uma esplanada recheada de amigos a celebrar uma nova vida, ao virar no cruzamento pode estar o trabalho que sempre quisemos. Essa é a beleza da incerteza. Tudo pode acontecer. Cada momento vive irremediavelmente separado e conectado ao anterior e ao seguinte, cada momento reserva o seu mistério.
A propaganda artística afoga-nos em expectativas que nem sempre são correspondidas, em esperanças que nunca chegam e em sentimentos que nunca experienciamos. Obriga-nos a viver a nossa vida apontando numa certa direção que pode nem existir e a sofrer com uma estrada sem fim.
Hoje não tenho final feliz.
Talvez amanhã tenha…
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