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Desculpa, Florbela

Desculpa, Florbela, que hoje escrevo em vão,

Que hoje me perco na sombra e na fala,

Que faço das letras um pobre refrão,

Cantado sem voz, sem alma, sem gala.


Há quem se esconda por medo ou por glória,

Há quem se erga sem nunca cair,

E há quem se perca, na própria memória,

E escreva sem nunca se ouvir.


Aqui se grita sem ter quem escute,

Aqui se cala quem pensa demais,

E os que se vestem de penas e luto,

São os mesmos que lançam punhais.


Falam de tudo, mas dizem tão pouco,

Enchem-se em rimas de um falso saber,

Erguem-se altos num palco já oco,

Lutando por glória sem nunca a ter.


De um lado, a pose que nada revela,

O grito vestido de grande opressor.

Do outro, o espelho que mente e se quebra,

E finge que é justo, mas só é rancor.


Falam sem medo, mas falam de lado,

Escondem-se todos na voz de ninguém,

E quando se veem no espelho rasgado,

Culpam o vidro, mas nunca o que têm.


A voz que se esconde na voz dos demais,

Que julga tão alto sem nunca pensar,

Que ri de um verso que jaz nos umbrais,

Que esmaga a verdade sem a escutar.


Ai, deixa-os, vida, dançar sem sentido,

Vazios de causa, de alma, de paz,

Que um dia a brisa, tão fria, tão lenta,

Apague estas vozes que falam demais.

 
 
 

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