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One battle after another

Corajoso e pertinente, mas não vamos fingir que é o primeiro bom filme com que nos

deparamos.


Nota: 4 estrelas


Confesso que ainda estou desapontado com o final, mas isso fica mais para a frente… Embora não considere One Battle After Another uma obra-prima, tiro o chapéu a Paul Thomas Anderson, que já não é nenhum estranho no que toca a produzir filmes de sucesso,

pois, a meu ver, o filme concretiza tudo a que aspira. A história baseia-se num tema que sempre foi polémico e controverso - a fronteira dos EUA com o México -, no entanto, com o que se tem passado nos últimos meses, é seguro dizer que o tema está mais inflamável do que nunca. Mesmo assim, a verdadeira controvérsia e ousadia deste filme é a posição moderada que assume, algo pouco comum nos dias de hoje. Através de simbolismos e personagens engenhosamente escritas, a mais recente longa-metragem de PTA procura capturar a essência humana e como esta se relaciona com a evolução da espécie ao longo da história.


Um dos meus aspectos favoritos deste filme é o quão não se leva demasiado a sério. O estilo disparatado do humor e dos antagonistas evidencia na perfeição o que refiro. Eu sei, eu sei, a minha frase ultra filosófica no final do parágrafo anterior não suporta esta afirmação, o que, para mim, eleva imediatamente o filme para outro patamar. A habilidade de cobrir temas sérios mantendo um tom leve e engraçado é algo que merece o devido reconhecimento. Sim, é inegável que o filme pretende transmitir certas mensagens e abordar temas sérios; contudo, há momentos em que é fácil perceber que o realizador apenas se quer divertir com as suas personagens, o que certamente será frustrante para aqueles que procuram significado em tudo. De certa forma, fazem-me lembrar os professores de português que, ao lerem o verso de poesia mais sóbrio e magro em conteúdo, eram capazes de elaborar meia página de apontamentos sobre o estado de espírito do sujeito poético. Um exemplo pertinente é a personagem de Sean Penn, um indivíduo que usa solas altas para aumentar a sua altura, roupa justa para acentuar os músculos e assume-se nazi para combater os seus impulsos sexuais, de que o próprio sente vergonha, o que culmina numa figura patética e hilariante. A meu ver, isto não se trata

de mais nada senão do realizador a divertir-se consigo mesmo e com a audiência; não o considero político, até porque ser anti-nazi não é propriamente uma posição que seja necessário realçar ou demonstrar. Esta relativa leveza impacta o ritmo de forma substancialmente positiva — duas horas e meia parecem metade —, factor muito importante tendo em conta a degradação do tempo de atenção desta geração.


Todavia, o verdadeiro trunfo deste filme é, sem dúvida, a sua posição moderada em relação a um tema tão controverso. Surpreendentemente, o filme ataca tanto o lado do governo dos Estados Unidos (esperado) como o dos revolucionários. Por um lado, critica os militares pelo seu abuso de poder e métodos reprováveis para extrair informação — até aqui nada de novo. Por outro lado, os revolucionários são expostos por usarem uma causa “libertária” como uma muleta para satisfazer os seus prazeres violentos e perigosos. Estes, em várias ocasiões, revelam-se egoístas, traidores e até ladrões vulgares. O casal de Bob (Leonardo DiCaprio) e Perfídia serve como exemplo. Perfídia é a encarnação do que afirmei acima, enquanto Bob, assim que nasce a filha, percebe que isso sim é algo com significado na sua vida, e que toda a ideia de revolução através da violência era apenas algo para preencher o seu vazio — descartável quando comparado com a responsabilidade de ser pai. (DiCaprio, para variar, mostra-nos que desconhece o conceito de não brilhantismo: fenomenal.) Perfídia apercebe-se disso tarde demais, marcando assim a sua conclusão trágica. O salto de quinze anos na história também pode servir de crítica, visto que, mesmo após atos de violência gratuita dos revolucionários, nada mudou e os prejudicados continuam a ser os mesmos — pessoas inocentes. A posição moderada é incorporada na personagem de Benicio del Toro, a calma debaixo do fogo, um homem que faz o que pode para ajudar as pessoas, mas condena os actos de violência dos revolucionários, evidenciado pela reação deste quando descobre que Bob é um ex-membro dos French 75: “You're a bad hombre”... A interpretação de Del Toro é imaculada; este aproveita ao máximo o pouco tempo de ecrã que tem, destacando-se pelos maneirismos hilariantes. Os rumores de uma sequela focada no personagem refletem a magnitude da interpretação. 


No que diz respeito ao simbolismo, foquemo-nos no clímax. O filme culmina numa perseguição de carros, onde Deandra (filha de Bob) é perseguida por um neo-nazi, numa estrada repleta de altos e baixos, como se de colinas se tratasse. Estamos, obviamente, perante um simbolismo que eu dividi em três interpretações possíveis, o que não quer dizer que não possam existir outras. Primeiramente, podemos interpretá-lo como a contínua batalha do oprimido contra o opressor ao longo da história, uma visão marxista que pretende resumir a nossa evolução a tal. Numa abordagem mais literal, também pode representar diretamente o nome do filme, uma batalha após a outra , que, de facto, é aquilo que as personagens vivem ao longo do enredo. A terceira, e na minha opinião a mais ajustada, é também a mais complexa: o revolucionário contra os que detêm o poder é um padrão recorrente e eterno na nossa existência, pois ambos os lados sofrem do mesmo problema — o erro humano. Não existe um lado objetivamente correto. Tanto o regime como a revolução colapsam pela ganância e fragilidade humana, representada pelas personagens.


Dito isto, o filme não está imune à crítica. O que me parece mais relevante destacar é a forma insatisfatória como é concluído um dos aspetos principais da história, a relação entre Willa (filha) e Bob (pai). Revela-se algo artificial e apenas está presente para criar emoção e um aparente final feliz, que, a meu ver, choca um pouco com a mensagem do filme — irei concluir esta ideia mais adiante. Também notei que, por vezes, o filme recorre a coincidências ou temas genéricos para permitir que a história flua e avance. Por exemplo, quando Deandra está nas mãos de um caçador de recompensas, este subitamente enche-se de princípios e sacrifica-se, sem mais nem menos, para a salvar, o que simultaneamente roça o coincidencial e o genérico (o habitual sacrifício épico de redenção, mas, neste caso, sem qualquer construção ou desenvolvimento).


Finalmente, gostaria de concluir comentando a primeira frase deste texto. A última cena deste filme mostra-nos Willa, após ter passado por toda a jornada de violência e perigo, a seguir as passadas revolucionárias do pai, ainda por cima com uma música feliz por detrás, como se se tratasse de um final feliz em que todos viveram felizes para sempre... Não! Passámos o filme todo a demonstrar as consequências desse caminho, e Deandra deveria ser o reflexo direto dessa aprendizagem, nem que fosse pelo exemplo do que aconteceu aos pais. Eu percebo que, de certa forma, faz alusão ao simbolismo do ciclo eterno a que me referi; no entanto, tal final também compromete parte da posição moderada que tanto elogiei no filme. Mesmo assim, One Battle After Another é uma experiência maioritariamente positiva, em que o bom claramente se sobrepõe ao mau — só acho que tem sido ligeiramente sobrevalorizado pelo público geral, que parece que nunca tinha visto um filme de qualidade.


 
 
 

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