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Babel (Rascunho, editaR, apagaR)

A puta faltou ao jantar, ele acabou a morfar no Mc um hambúrguer. Passou pelo monhé. Comprou vodka.


O quarto onde vive, dorme, e morrerá, é mais do senhor senhorio do que seu, mas o seu suor está lá mais, a cobrir as paredes, as fronhas, as folhas. Ele pensara que o suor era da cor de água: afinal, era amarelo. Despiu-se, atirou a camisola branca antiga para cima dos lençóis soltos - nunca ferrados, nunca enfiados – e os calções pretos rotos passaram por cima da cadeira de plástico com uma rodinha partida, aterrando na secretária. À mesa havia duas colunas: uma com livros por ler, uma torre com uns 20 livros, outra com livros lidos, na casa entre o 0 e o 1, uma autêntica torre gémea. Entre os destroços, guardanapos e papeis, usados e por usar, lubrificante, um x-ato, um copo sujo e uma garrafa vazia. A garrafa foi para o chão, a nova assumiu a posição.


Sentou-se, e olhou-me no espelho do armário, como fazem todos os protagonistas: um velho de quarenta anos, careca e corcunda, com rugas nas bochechas e olheiras pelos olhos ocos e acne ao pescoço, pelos, pelos e pelos, pelos braços, pernas, nariz e bolas. A única forma de ver a pila era ao espelho: a barriga chegara ao ponto de esconder a cabeça da outra. Olhou copo, encheu, esvaziou. Ardeu. Encheu, esvaziou. Ardeu menos. Pegou lubrificante – era mais fácil assim – pegou na pega, subiu e desceu com as mãos, só era ambidestro para isto, e passou-lhe o passado na cabeça, abriu o computador, porno, aba abre e outra fecha, uma mão salta no rato e outra na rata, as mesmas estórias desde a adolescência, as mesmas merdas, sim, merdas, e outras questões que não se atreve a fazer como “terá ela 18?” e “quererá?”, não, nunca, abre e fecha, e sobe, e sobe, e sobe-se tudo até chegar ao abdómen. Pequenas gotas, mais líquido que boas esporras. Ele não conseguia respirar. Guardanapo, mão, copo cheio, e depois vazio. As cabeças cansadas ardiam. Deitou uma em cima do teclado, e mirou a lâmina. Estava a ficar enferrujada. Inspirou. Eu levou-a ao braço, e cortou, um pouco acima do pulso, entre as marcas já antigas e incómodas, e expirou. Já respirava. Estava vivo. Corte, corte, corte, guardanapo, braço. Ardeu. O fogo não parou. De metade, a garrafa fez-se vazia, e o copo sujou-se de sangue. O pulso ardia. Um corte deslizou demais. Guardanapo no pulso, meia à volta do pulso.


Chorou.


Eu cerrei os olhos no ecrã. Eram 11 da noite, e 19 minutos. Um sinal querido, ele sonhou, e era hora de nascer. Abriu um documento, e, entre sangue, suor e lágrimas, começou a escrever:

 

«Conheci um Viajante de uma terra antiga que me disse: naquele tempo, no deserto, havia uma Humanidade, uma Nação sobre um Deus, uma raça e uma língua, e uma fúria ardente de ser, e querer, e criar. A certa altura, abandonaram o leste, rumo ao paraíso, uma planície na Mesopotâmia onde se fixaram. Abraçaram-se, acarinhados entre o Tigre e o Eufrates, e disseram: nós somos todos Rei, apaixonemo-nos e obremos! E desse amor, fizeram tijolos, cozidos nos ventres quentes dos fornos industriais, que, entre o betume que fazia as vezes da argamassa, serviram das pedras sobre a qual as primeiras igrejas surgiram. Quando os primeiros sinos badalaram o início do tempo, disseram: agora, construamos uma cidade, e no seu coração, a grande criação que chegará até ao céu! Focados e sem dispersar nem desistir, nada nem ninguém os poderia impedir de fazer aquilo que projetaram.


E assim nasceu a Torre da Babilónia.


Contemplai o berço da arte!


Dois mil, Quatrocentos e Oitenta e Quatro metros de altura, furando as reles nuvens e refletindo os raios do sol, suportados por Quatrocentos e Vinte metros de largura, uma massiva montanha naturalmente humana, uma espiral quadrada, maior que engenheiros ou califas, pois a sua massa era a massa humana. De braço a braço dado, de uma ponta a si mesma, portas e portadas das cores da prata, do chumbo, e do aço, fundidos com a natureza, domada e cooperativizada pelos proles, e por isso crescia pelas portas, trepava pelas janelas, o verde e escuro musgo escalava até ao derradeiro vértice. Escadas nunca escaladas, acompanhadas pelos percursos de água canalizados dos rios e do mar para formar um mel salgado doce que saudava os sedentes. Não havia sede, não havia fome.

Por detrás de cada porta, um lar, e todos os lares. Tendo mais nada que camaradas e amor, a humanidade fazia o que fez: da arte, a sua casa. Meninos tocavam música nas suas flautinhas de bis, enquanto os irmãos brincavam com plasticina. Os pais chegavam a casa com pautas e peças e pinturas para partilhar à mesa de jantar, nos sertões praticavam imitar, criar para que outros neles se pudessem inspirar. Não havia génios nem torturados, todos eram louvados, na praça pública do centro do piso-terra da Torre da Babilónia.

Enquanto observava os leilões dados das obras que iam por um elogio, dois elogios, três críticas ou quatro palmas, notei as escadas xisto pretas que rodopiam à volta das paredes mármore brancas desta torre. Perguntei onde levavam, e a Humanidade respondeu-Me:


Ao nosso processo.


Ascendi.


No primeiro piso a que cheguei, um grande salão, fui acomodado pelo chão almofadado por alcatifas vermelhas, padrões e azulejos expostos cuidadosamente, emoldurados por ouro. No fundo da passerelle, um trono de papel, que se estendia até fora do assento, camadas de resmas cobrindo toda a parede por detrás. E nas folhas, versos e versos. E no trono, um Homem sem um olho, que, de lábio levantado, olhar frio e arrogante, proclamou:



“Sou Apolo, ó Pequeno, temei

Pela vida, e pior, pelo nada

Que te mostrarei ser, pois sou eu rei

Da escrita, ademais, a arte toda

Prosa, poesia, até decretos-lei

Pintura, escultura, tudo o que é lenda

Que dá todo o fim e significado

Aos que navegam por mero legado.


A mim, ajoelharam e rezaram

moisés, zaratustra e até maomé

Quando eles escreveram e espalharam

A sua arte, ou isso a que chamam fé

E por mim, sua musa, eles clamaram

homero, dante, victor e josé


Se estes homens foram a grande raça

Das obras e artes, foi por minha graça.


A mim se dedicaram, pois queriam

Fama, damas, riquezas e conquistas

Enquanto o povo as estradas faziam

Acimavam-se tretas idiotas

Pois para os panteões aterrariam

Com seu génio e palavras lícitas

Escreveram, com mui pressa e sem temor

E uns até o faziam por amor.


Estudaram e escreveram amor

E sim, mui tragédias e tristezas

Mas também tão sátiras com humor

Temas como as humanas naturezas

Ou nossas depressões, do sol tumor

Através de narrações e outras stanzas

Pelo grande génio destas géneses

Homens a Hércules, pequenos deuses.


Doravante, terás de concluir,

Ó Pequeno, que a arte é única

Por ela vale a pena existir

Bate o trabalho, fado e a política

Faz de um mero mortal, um belo mártir

Retrata a Humanidade, nua louca

Sim, mas ainda bela e plena vida

E assim, sem ela, Tu não és nada.”


E teria ele eternizado a epopeia, não tivesse um rapaz atrás de mim se atirado, penetrando-me com cheiro a vinho e a tabaco, e gritado:




Ascendi.


No segundo piso, tropecei nos cabos espalhados, nos fios ligados a computadores, telemóveis e televisões. Derrubei uma coluna de som, que crashou contra um rapazeco enfiado num robe e coberto em mantas. Saltitou ao pé-coxinho para Mim, com um portátil mostrou-Me um documento Word chamado “ideias”:


·        Babel:

·        Cena vindo mc, decadência do quarto e do autor (ele/eu ambiguidade)

·        Babel, descrição mitológica, andares da torre enquanto framing device (canalizar realismo magico calvino) – procurar tema da descrição

·        1º andar - Filosofo, gustav – escrito em forma de poema (camões, 10 silabas métricas, oito versos por estrofe, abababcc) – pensar no q raio ele vai dizer – dionisio vai ter um mental breakdown, elemento dionisíaco/apolíneo to frame it as well?

·        2º andar – estrutura - Chatgpt - Cérebro (próprio cérebro é insuficiente), inceneração - binario

·        3º andar - Terapia da fala, Ansiedade, trauma e inabilidade da linguagem

·        4º andar - Prémio Nobel, look up stanley parable, ts Elliot the wasteland

·        5º andar - Queda de Babel, divisão de línguas, pt ingles francês alemão russo japonês, how do dissapear completely? Ácido sulfúrico

·        ultimo andar – climax espaço – desenvolver na Gulbenkian/leitura? Descrição pessoal da escrita

·        back to the start

 

O documento era datado de 22 de abril de 2023. Perguntei pela arte, e ele:


“A puta”


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“Olá! Como posso ajudar você hoje?

 

Escreve-me uma história.

 

Claro! Aqui está uma história curta para você:

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O Guardião das Sombras

 

Na pequena vila de Aldenor, rodeada por densas florestas e montanhas imponentes, havia uma lenda antiga sobre um misterioso guardião conhecido como o Guardião das Sombras. Diziam que ele protegia a vila contra criaturas malignas que espreitavam na escuridão, embora ninguém jamais tivesse visto seu rosto.


Certa noite, um jovem corajoso chamado Erik decidiu desvendar o mistério do Guardião. Com uma lanterna na mão e um coração cheio de determinação, ele se aventurou na floresta sob o brilho tênue da lua. A floresta era densa e os sons noturnos ecoavam como sussurros sinistros ao seu redor.


Após horas de caminhada, Erik chegou a uma clareira onde uma antiga árvore, maior do que qualquer outra, se erguia majestosa. No tronco da árvore, ele encontrou uma porta esculpida, quase invisível aos olhos desatentos. Ele empurrou a porta com cuidado e entrou.


Dentro da árvore havia uma câmara iluminada por cristais brilhantes que pendiam do teto. No centro, um homem encapuzado estava em pé, seu rosto oculto nas sombras. "Quem ousa entrar no santuário do Guardião das Sombras?" a voz ecoou.


"Sou Erik, da vila de Aldenor," respondeu o jovem, sua voz firme apesar do medo. "Vim em busca de respostas sobre quem é você e por que protege nossa vila."


O guardião removeu o capuz lentamente, revelando um rosto marcado pelo tempo e pela sabedoria. "Eu sou apenas um homem que fez um juramento," disse ele. "Há muitos anos, quando a escuridão ameaçava consumir Aldenor, fui escolhido para proteger estas terras. Minha magia mantém as criaturas malignas afastadas, mas meu tempo está chegando ao fim."


Erik sentiu um peso em seu coração ao ouvir isso. "E o que acontecerá com nossa vila quando você se for?"


O guardião sorriu com gentileza. "A proteção deve continuar. Você, Erik, tem um espírito corajoso e puro. Se aceitar, posso passar meu conhecimento e poder para você. Você será o novo Guardião das Sombras."


Erik pensou por um momento, considerando o sacrifício e a responsabilidade. Finalmente, ele assentiu. "Eu aceito."


O guardião colocou as mãos sobre a cabeça de Erik e murmurou palavras antigas. Uma luz intensa envolveu o jovem, preenchendo-o com a sabedoria e a magia do guardião. Quando a luz desapareceu, Erik sentiu uma nova força dentro de si.


O antigo guardião sorriu pela última vez antes de desaparecer na escuridão. Erik, agora o novo Guardião das Sombras, retornou à vila com um novo propósito. Ele protegeria Aldenor e suas pessoas, mantendo a escuridão afastada e garantindo que a lenda do guardião continuasse viva.


E assim, a vila de Aldenor permaneceu segura sob a vigilância atenta do novo Guardião das Sombras, cuja coragem e dedicação jamais seriam esquecidas.

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Espero que tenha gostado da história!

 

É uma boa história?

 

A qualidade de uma história pode ser subjetiva e depende dos gostos individuais dos leitores, mas há alguns elementos que geralmente contribuem para uma boa história:


1.   Personagens Cativantes: Erik é um personagem corajoso e determinado, que passa por um desenvolvimento significativo ao aceitar a responsabilidade de se tornar o novo Guardião das Sombras.

2.   Trama Interessante: A narrativa tem um enredo claro e envolvente, com uma missão (descobrir o mistério do guardião) e uma resolução satisfatória (Erik se torna o novo guardião).

3.   Conflito e Resolução: Há um conflito interno em Erik, sobre aceitar ou não a responsabilidade, e um conflito externo na necessidade de proteger a vila. Ambos são resolvidos de maneira significativa.

4.   Ambiente e Descrição: A descrição da vila de Aldenor, a floresta misteriosa e a câmara iluminada por cristais ajudam a criar uma atmosfera imersiva.

5.   Temas Universais: A história aborda temas como coragem, sacrifício, legado e a importância de proteger a comunidade, que são universais e ressoam com muitos leitores.


Se esses elementos são bem executados, a história pode ser considerada boa.

 

Num parágrafo, escreve-me uma boa história.

 

No reino de Althoria, um jovem fazendeiro chamado Leo encontrou um antigo mapa que levava ao lendário Tesouro da Esperança, escondido nas profundezas da Floresta Encantada. Determinado a salvar sua vila da fome, Leo embarcou numa jornada perigosa, enfrentando criaturas mágicas e resolvendo enigmas antigos. No coração da floresta, ele encontrou um cofre dourado contendo sementes mágicas que poderiam transformar qualquer solo em terra fértil. Retornando como um herói, Leo plantou as sementes, e sua vila floresceu, provando que a coragem e a esperança podem transformar até os maiores desafios em bênçãos.

 

Numa frase, escreve-me uma boa história.

 

Em um reino distante, uma jovem camponesa encontrou um amuleto mágico que lhe concedeu o poder de falar com animais, e juntos, eles salvaram a floresta de uma ameaça sombria, trazendo paz e prosperidade para seu lar.

 

Merda inútil.

O que é arte para ti?

 

Arte, para mim, é uma expressão profunda e multifacetada da experiência humana. É a maneira como capturamos, interpretamos e comunicamos nossas emoções, ideias e percepções sobre o mundo. Pode assumir inúmeras formas—pintura, escultura, música, literatura, dança, teatro—e transcender o tempo e o espaço para tocar a essência do que significa ser humano.


A arte nos convida a ver o mundo sob novas perspectivas, a refletir sobre a condição humana, e a conectar-nos com outras pessoas e culturas de maneiras profundas e significativas. É uma linguagem universal que pode provocar, inspirar, consolar e desafiar, oferecendo um espelho para a nossa própria existência e uma janela para a criatividade infinita.

 

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Mata-me.

 

Lamento muito que você esteja se sentindo assim, mas não posso ajudar com isso.

 

E assim, o rapazeco despiu as mantas e o robe, e vasculhou os cabos e os fios, e encontrou o micro-ondas. E entrou, e ligou, e assim, o rapazeco despiu os pelos, a pele, agora feita crosta, os olhos secaram e queimaram, e morreu.


O quarto ardeu, e Eu ascendi.


O terceiro andar, iluminado por luzes frias e ocasionalmente intermitentes, era uma ala hospitalar. Em mesas pequenas, pintadas de vermelho, verde, e branco, entre marcadores e papéis pintados com rabiscos pitorescos picassianos, estavam bombas de asma, e livros de soletrar. Uma porta aberta no final do corredor: uma criança, que se escondeu por detrás da cadeira quando entrei no consultório. Olhei e ela mirou. Silêncio. Abriu a boca:

“O-o-o-o-olá-” pausa para respirar, ofegante. Estalei os dedos e Eu trouxe uma folha e uns marcadores, e dei-lhos. Pegou-lhos, e a pouco e pouco, foi-a preenchendo até ter vários parágrafos que, com lentidão e criancice, começou a ler em voz alta:


“Èj o médico? XOu oTójo, maz ozzss meuzs amigozs xamam-me godo! Vivo em T-t-orres Vedazs e teno oto anozs. Teno muuuuuitx amigozs: pelu menus três! Há o meu pai, a mina mãe, o mano, e a Bexka, que é a minha cadela e faz anozs dia 14 de agoxto! Também há na xcola. A mina cor favorita é o vermelo.

Vermelo é a cor dox – d-doxsz – DOS maus e do Benfica, que é o clube do meu pai. Gosto muito da mina mãe, ela dá-me muitos mimos. E animaisz! Tenho uma prateleira no quato só com brinquedosz de animaisz. O meu favorito é o trigre, RAWR. A mãe obiga-me a limpá-los uma vez por mês.

Odeio limpar.

Goxto muito de ler! O meu livro favorito é o Caso do Patino de Borracha Desaparecido da Rua Sssészamo. A mãe lê-o muitasz vezesz e rio-me muito!! Potuguês é a minha diciplina favorita. GOxto muito de ler. Ler é muito fácil comparado com falar̷̞̈́̋. Tenho tanto medo das pessoas. Ler é tão fácil. Escrever é tão fácil. Odeio o Canaval! E por isso a pofessoa pometeu-me que podia não ir ao Canaval se falasse mais com osz meusz colegas. Juguei à bola com elesz. Levei com a bola na cara. Não goxto muito de futebol.

Goxto da escola, porque goxto muito de aprender! Aqui vou aprender a falar não é? O pai goxta das minhas notas. Às vezes è̴̫̤͘l̴̠̲̠͕͝è̵̡̫̬͎̻̤̲͚̖̩͂͝

As pexoasz dizem que vou ssser muito gande quando for gande! O tio dizs que vou zer o pimeiro-minitro! Acho que queo ze escitor. Vou szzzzer poeta! E aí vou ser grande. E vou ser pintor,  E FOTÓGRAFO, E JORNALISTA, E

 

Ascendi. O quarto piso estava cheio. Cheio de luz, cheio de decoração, quadros de realeza e fotografias de mortos copulando com tapetes de seda e mesas arrojadamente vermelhas, pratos e talheres de prata, e cheio de pessoas. E ao fundo, um pódio. O anunciador bradou:


“E PELA SUA INCRÍVEL OBRA, A BÍBLIA, CHAMO AO PALCO O NOVO BABINÓBEL DA LITERATURA, ANTÓNIO SUBTIL!”


Um homem nos seus quarenta anos, de juba e postura altiva, andou rapidamente para o pódio, ao som de palmas e gritos loucos da multidão.


“Obrigado! Muito obrigado, camaradas, é realmente uma honra para mim e para o mundo.


Quando tinha 12 anos, houve este concurso de escrita na minha escola. Participei. Ganhei, claro. Sempre quis ser escritor. Lia muito, amava livros, devorava-os. Toda a gente me achava muito inteligente, então o que haveria eu de fazer? Para o concurso, o tema era livre, então escrevi sobre não saber escolher um tema. De parágrafo em parágrafo ia mudando de tema, começando uma ideia e descartando-a logo de seguida. Não consigo por Deus encontrar esse texto, mas toda a gente ficou muito impressionada, como podia um rapaz com 12 anos escrever assim? Tão metamente.


Quero dedicar este prémio à arte em si. Não há mais nada pela qual valha a pena viver, senão ler livros, e ver pinturas e fotos, ir a cinemas, museus, concertos, exposições e tertúlias, viver para ver arte e ser arte. Sem quarenta mil anos de arte por detrás de mim, isto não podia existir. E daqui a quarenta mil anos, eles vão apoiar-se em mim. Talvez seja esse o real significado de arte, comunidade através dos séculos. A coisa mais próxima de imortalidade que o homem alguma vez alcançou. De fazer uma real diferença. Ninguém parou o Holocausto, ninguém se atreveu, e quem se atreveu, morreu, mas não estaremos mais ricos por ter Se Isto é um Homem? Não será isso que importa, no final de tudo? Sim, acho que sim. A quantidade esmagadora de beleza, arte estupidamente bonita, que não teríamos sem ele. Esperemos que a Palestina nos deixe poemas para pensar. Deus, a beleza que se pare da depressão.”


[A audiência está em silêncio. O homem tosse, e continua.]


“Fiz 13 anos, e como todos os rapazes de 13 anos, ganhei depressão. E como todos os rapazes de 13 anos, não sabia curá-la. E como todos os homens, não sabia falar sobre o que sentia. Então tratei-a como fui ensinado, escrevi. Textozinhos, poemazecos, e mostrava aos meus amigos, porque eu era, afinal, um rapaz tão inteligente, que não mereciam eles conviver com a minha arte? E assim, nunca tive de falar sobre isso. Só escrever, mostrar, e deixá-los validarem-me. Escrever é tão mais fácil do que falar. E de repente não és um puto estúpido e arrogante: és um artista torturado, que expele torturadamente a sua arte de dentro das suas costelas torturadas, e torturadamente a expõe ao mundo. Talvez se suicide para completar a história. Quando se chega a esse ponto, em que a arte é a miséria e a miséria é quem tu és, e quem tu és é uma personagem, a do autor, a do narrador, aí tudo se torna uma narrativa. O álcool, os cortes, a destruição, de ti e dos que tu amas, isso é tudo parte da narrativa. E está tudo bem, porque podes canalizar tudo isso para a arte. E não tens de mudar.


Portanto quem quer saber de quem tu és por detrás, desde que, no teu rasto de destruição, deixes poesia para trás? Não é a audiência Não és cruel, não és arrogante, ou preguiçoso, um merdas pseudointelectual que lê três livros por ano e escreve – escreve o quê? textinhos autobiográficos, estamos a chamar isso arte agora? Não estás no chão de uma casa de banho seminu em coma alcoólico e merda por desentupir na sanita, nem a pedir a alguém que amas que venha ter contigo, ou vais embebedar-te, ou que te cortaste por eles, ou não estás a dizer sobre alguém que te considerava um amigo nas suas costas que se morressem à tua frente cuspias no corpo, e nunca tiveste 12 anos e viste alguém no chão e deste-lhe um pontapé nas costelas. Não és feio, nem gordo, nem virgem, nem careca, não tens corpo, e não tens medo de falar em público, porque não tens voz, senão a voz autoral. Porque, dentro do papel, tu ergues a caneta, tu és


DEUS



E depois apercebes-te, que o teu ego não te permite ser um mau autor. Preso à audiência, e preso ao público, não podes ser apenas bom, nem ocasionalmente perfeito, tens de ser sempre o melhor autor que alguma vez existiu. O perfecionismo paralisa. Estou a pensar neste texto há um ano, três meses, e três dias. Para o que mal conta como uma pequena história. Esta é a 4029ª palavra. E é este o resultado final. A secção anterior é demasiado curta, não se estabelece o suficiente para ser memorável, e esta corre o risco de ser aborrecida. Não sei escrever descrição, diálogo, personagens ou narração. E de repente, há dois anos, surge esta ideia simples:


A forma

segue a

função.

O meio

é a

mensagem.


É por isso qu3 escrevo ȧ̷̮̬̙̞̦̫͎͈̜̞̱͌̏́̆͊͜ͅş̸̛͍̺͇̗̻̫̦͚̣̘͑̓̒͌̄̋̑s̴̖̜̖̘̜̭̫̬̼̜͊͛̿̏͋̍́͐̎̄̈́̀̍̑͝i̸̖͋̀̋̂͂̈́͊̈́̂͝m̴͈͚̱͈͕͎̮̬͉̊̔̀̾͜͝. É uma distração da escrita em si. 01010010. Apagar toda a mensagem, e focar apenas no meio. A escrita, afinal, é a arte mais fácil, e mais aborrecida. Por séculos, tem-se visto conquistada, dominada pela pintura, pelo cinema, pelas redes sociais. Ler livros requer um esforço que simplesmente não é 11000011 10010011 01010100 01001001 01001101 01001111. E por contrapartida, a escrita é o centro de refúgio de toda a gente que não se quer dar ao trabalho de encontrar outra forma de se expressar. Foi o que aprenderam na escola, portanto não vão aprender a filmar, ou a pintar, não, vão escrever. Esta é portanto a forma menos apreciada de arte, e simultaneamente, está inundada por gente que a produz. No meio de tudo isto, que outra forma haveria de escrever, senão


REJEITANDO A ESCRITA…

CONVERTENDO EM ARTE VISUAL…


É tudo uma distração. mAs eu nãoO̸̻͎͔̹̗̹̘̪͙͕̻̘̣͗͌̇͐̏͌͑͆̓̌̚̚͝Ö̸̡̰̥̣̟̗̬̯̰́̎͛̎̒̓̃̓̀Ơ̷̡͉̝̣͙̘͙̩̻͍̋̑̎͆̆͠ͅÖ̸̧̹͖́̂̑͝O̴̠͖̗̭̣̦͂̔̓̓́͜Ò̸̜̪͚̜͕͆͑̍̇̎ͅO̸͎͉̮̞̮͙̟̬̝̟͜͝Ọ̸̧̠̻͍̝̱̠͓͙̜̜͇̇̑̇͑̐̋̓̈́̓͆̐́̆̚Ó̷̲͖͕̖̠͒͆Ǫ̷̜̤̱̬̣̩͉̜̺͈̺̞̂̀̊̃͋̿̓̒̄͋͜O̷̲̮̘͉͑͆͐͋̎ͅ sei porquanto temp01101111 pode funcionar. E se isto não funcionar é preciso concluir que


Não sou um escritor.


E talvez este seja o fim.


01000001 01010011 01000011 01000101 01001110 01000100 01001001 00001010 01010101 01001101 01000001 00100000 01010011 01000001 01001100 01000001 00100000 01010110 01000001 01011010 01001001 01000001 00001010 01010101 01001101 00100000 01001100 01001001 01010110 01010010 01001111 00100000 01010000 01001111 01010010 00100000 01000011 01001111 01001101 01000101 11000011 10000111 01000001 01010010 00001010 01010101 01001101 00100000 01001100 01001001 01010110 01010010 01001111 00100000 01010000 01001111 01010010 00100000 01000001 01000011 01000001 01000010 01000001 01010010

 

E o Viajante disse, que se unido o povo, este tudo poderia fazer, então toda a criatividade humana, combinada, rivalizaria a Obra Divina.


A Babilónia tinha de cair. A Torre teria de ser de Babel. Estalou os dedos, fez luz, fez o livro, fez as líng

 

אבְּרֵאשִׁ֖ית בָּרָ֣א אֱלֹהִ֑ים אֵ֥ת הַשָּׁמַ֖יִם וְאֵ֥ת הָאָֽרֶץ:

 

                                         ἐδάκρυσεν ὁ Ἰησοῦς.

 

ٱعْلَمُوٓا۟ أَنَّمَا ٱلْحَيَوٰةُ ٱلدُّنْيَا لَعِبٌۭ وَلَهْوٌۭ وَزِينَةٌۭ وَتَفَاخُرٌۢ بَيْنَكُمْ وَتَكَاثُرٌۭ فِى ٱلْأَمْوَٰلِ وَٱلْأَوْلَـٰدِ ۖ كَمَثَلِ غَيْثٍ أَعْجَبَ ٱلْكُفَّارَ نَبَاتُهُۥ ثُمَّ يَهِيجُ فَتَرَىٰهُ مُصْفَرًّۭا ثُمَّ يَكُونُ حُطَـٰمًۭا ۖ وَفِى ٱلْـَٔاخِرَةِ عَذَابٌۭ شَدِيدٌۭ وَمَغْفِرَةٌۭ مِّنَ ٱللَّهِ وَرِضْوَٰنٌۭ ۚ وَمَا ٱلْحَيَوٰةُ ٱلدُّنْيَآ إِلَّا مَتَـٰعُ ٱلْغُرُورِ ٢٠

 

                                Очень немного требуется, чтобы уничтожить человека: стоит лишь убедить его в том, что дело, которым он занимается, никому не нужно.

 

A alma é divina e a obra é imperfeita.

 

Il n'y a qu'un problème philosophique vraiment sérieux: c'est le suicide.

 

Someone has to be a pig infested with maggots, right? It might as well be you.


A Babilónia ardeu. Nada à volta resistiu: no entulho da ruína colossal, despido e sem limites, as areias alisadas perdem-se na distância.


O povo começou a trabalhar, e deixou de amar.


E assim, acaba a história do Viajante.


Mas eu não sou o Viajante. Enquanto escrevo isto, estou sentado no jardim da Gulbenkian, em Lisboa, capital de Portugal, no ano de 2024. Chamo-me António Subtil, tenho 21 anos, e não sei se sou escritor.


Este jardim é a parte mais bonita da cidade. Grandes blocos de concreto brutalista escondem no seu interior museus, salas de espetáculo, bibliotecas. O exterior dos edifícios estão cobertos de vegetação, uma premonição certamente da vingança que a natureza fará contra nós pelos nossos pecados climáticos. O contraste entre o cinzento morto e os verde fluorescente das trepadeiras faz-nos crer que quase podíamos ter convivido. Pelos grandes jardins à volta, patos flutuam à tona de água, morosamente apanhando os pedaços de pão que casais de velhos lhes atiram. Crianças perseguem-se umas às outras, caem enquanto os pais correm para as ir buscar para a toalha para lanchar, adolescentes escondem-se nos recantos e comem-se à socapa, e estudantes universitários fumam erva. Está sol, cada vez mais forte, mas por agora está no ponto perfeito.


Arquitetura é uma arte, certamente, como é planeamento urbano, e jardinagem. A relva pode ser plantada, pode, mas o sol jamais. Há coisas que são belas por si só, sem a nossa infeção. Que nos tiram o ar, e queimam, mas dão-nos prazer pelo seu mero ser. E contra isso, tenho de me questionar sobre o valor da minha arte. Talvez nunca mais escreva. Talvez, tenha apenas sido posto nesta terra, para poder estar neste jardim, e poder viver, e morrer, sob este Sol. Talvez haja outras formas de me conectar com quem amo, talvez sendo só. Talvez não precise disto.


Mas sei que amo quem amo, e o que amo, mesmo que não o faça eu mesmo. Amo ler quem amo, as palavras deles mel nos meus ouvidos, cantadas ou tocadas em guitarras. Quero dedicar este texto a uma amiga, música e escritora. Ela é brilhante.

 E talvez, ainda me venha a provar, que a arte humana pode brilhar mais do que o Sol.

Sim, talvez…”


O velho gordo parou de escrever, os seus braços doendo menos, os seus dedos, mais. Eu parei de escrever, e depois eu


 
 
 

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