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Sem Direito - Filipe Brito Bastos (FBB)

Writer's picture: Jurpontonal Nova Law LisboaJurpontonal Nova Law Lisboa

A Maria Castro Ribeiro e a Maria Leonor Baptista, coordenadoras de entrevistas do Jur.nal apresentam o segundo episódio do segmento de entrevistas Sem Direito. Desta vez, convidamos o professor Filipe Brito Bastos. E o Francisco Jesus veio tirar umas fotos. A conversa foi longa.

 

MCR: “Filipe Brito Bastos, nascido em Vila Nova de Gaia, do signo sagitário, vive atualmente na Malveira perto dos estúdios do Big Brother. Na sua adolescência cresceu a ouvir Pink Floyd e Nirvana e diz que a música de intervenção portuguesa é o pior estilo musical. A sua série favorita é Criminal Minds. É presidente do sindicato dos funcionários judiciais, mas ainda sonha vir a ser psicólogo terapêutico em cadeias de alta segurança. No seu tempo livre é bailarino, tendo obtido uma série de prémios de bailado profissional. Todos os anos a família Brito Bastos desloca-se à Pennsylvania nos Estados Unidos para o dia do Groundhog Day.

Professor, daqui o que é que podia ser verdade?”


FBB: “Por ordem? Eu poderia noutra vida ter sido de facto de Vila Nova de Gaia, visto que metade da minha família é do Porto. Em segundo lugar, em relação à música, é um facto que eu passei os meus anos de adolescente a ouvir Pink Floyd e Nirvana e outras coisas. É um dos meus preferidos, aliás, apesar de hoje em dia não ouvir os Pink Floyd, devido ao Roger Waters.”


MCR: “E quer dizer também que acha que a música de intervenção portuguesa não é boa?”


FBB: “Não, essa é outra coisa. Eu acho-a feia, em geral. Acho-a pirosa, em geral. Mas dentro do género, imagino que hajam algumas que sejam mais decentes. Eu gosto, por exemplo, (não sei se conta como música de intervenção) mas o Acordai, acho bonito. Conta?”


MCR: “Mas e um Sérgio Godinho, um José Mário Branco? Acha grosseiro?”


FBB: “Acho folclórico… Mas voltando às outras questões, em relação à Malveira, é perfeitamente plausível, porque sou um orgulhoso filho da região saloia, que, como devem saber, se estende desde Alverca, passando por Loures (daí eu usar tantos casos práticos passados em Loures), Odivelas, Sintra, Malveira e acho que chega até Ericeira… mas enfim, essa zona… Sim, Malveira seria perfeitamente plausível. Bailarino? Não seria plausível, de todo. Eu não danço. No meu casamento, não houve primeira dança. Houve um concerto dado por mim e pela minha mulher. A minha mulher, embora gostando muito de dançar, sabe que, não me sinto de todo à vontade a dançar, enquanto que, tocar em público, pelo menos para a minha família sinto.”


MCR: “E em relação a ser presidente do sindicato dos funcionários judiciais?”


FBB: “Um completo disparate.”


MLB: “Os sindicatos?!”


FBB: “ Eu não tenho nada contra sindicatos… (entre risos) se era essa a insinuação… não tenho nada contra sindicatos. São um importantíssimo instrumento de contra-poder, exceto quando se tornam no poder.”


MLB: “Bom mas vamos à parte cor-de-rosa da vida… o professor já está a politiquizar.”


FBB: “Não, não, era mesmo só uma boca sobre a apropriação partidária de sindicatos.”


MCR: “E em relação ao Groundhog Day?”


FBB: “Aquela coisa das marmotas? Olhe, eu adoraria ver marmotas todos os anos, adoraria. Acho que uma peregrinação Brito Bastos até lá seria um projeto sim.”

 

A Maria Leonor Baptista introduz o segmento que nos dá a explorar a parte mais cor-de rosa da vida.


MLB: “Queremos saber como era na faculdade, mais estudioso/ mais baldas?”


FBB: “O que é que acha? (entre risos) Digamos assim, há muitas experiências diferentes de quem faz o curso na FDUL. Algumas pessoas ficam a gostar muito da FDUL e de Direito, outras pessoas ficam a gostar muito de Direito… Eu talvez fosse mais do tipo estudioso, se faltava a aulas era de Direito do Trabalho, porque, enfim… não vou dizer o que penso de Direito do Trabalho ou alguns colegas meus crucificar-me-iam…”


MLB: “E essa questão é mais ou menos política do que a dos sindicatos?”


FBB: “De todo… se queremos ir por aí… Mas faltava essencialmente a Direito do Trabalho e a Direito da Família. Direito da Família, não por ser Direito Privado. Eu gostei muitíssimo de Direito das Obrigações, gostei muito de Direitos Reais, foi a primeira disciplina que dei, e parece que ainda circulam por aí sebentas, apontamentos e exercícios que fiz para os meus estudantes e que até partilhei com alguns estudantes do terceiro ano. Mas portanto, Reais gostei muito, Obrigações gostei muito, mas Família e Trabalho… digamos, que tudo, o que envolva estudar muita legislação, tendencionalmente, não sou grande fã.”


MCR: “Mas não parece… o professor dá muita legislação a estudar agora…”


FBB: “O quê?! Está a falar de Direito da Organização Administrativa? Apanhou-me.”


MLB: “E em criança que profissão queria ter?”


FBB: “Há uma que fica na memória mas eu era mesmo criança: Pastor de Dinossauros. Era mesmo criança, não conservei esse sonho até à adolescência (entre risos). Agora, o que me ocorreu fazer para além de Direito? Eu estive quase a estudar História e Literatura na Alemanha e imaginei-me talvez a estudar algo na área das Humanidades. E cresci bilingue na Escola Alemã de Lisboa e portanto tive a dado ponto interesse em estudar na Alemanha, até cheguei mesmo a ver residências.”


MCR: “O que é que o fez não ir?”


FBB: “A brutalidade crua do mercado de trabalho. Mas para além disso, o facto de, para mim ter ficado claro que mesmo em Direito o interesse por línguas estrangeiras e interpretação e pela história é algo muito importante.”´


MCR: “E olhando para a sua experiência na FDUL?”


FBB: “Pois… apanhou-me! Não, não foi um estudante especialmente feliz na FDUL. Por tudo um pouco. Mas mais a relação entre os estudantes.”


MLB: “Daí a sua referência Os estudantes de Direito não têm amigos?”


FBB: “Sim. É uma referência à brutalidade que se vê em faculdades nas relações entre colegas. Não sei se alguma vez referi a situação dos emails de turma da FDUL. Nós não tínhamos Moodle, no meu tempo, tenho essa idade pré-histórica. O que tínhamos era um email de sub-turma. A sub-turma inteira, que eramos 30/40 tinham acesso à passe, portanto o professor enviava coisas e esperava que toda a gente entrasse no email, descarregasse os casos práticos e depois resolvesse. Por sistema, esses emails eram apagados. Mais do que competitividade, muito mais do que isso… era algo que acontecia muitas vezes ao longo do curso e foi algo que aconteceu a turmas minhas quando fui assistente na FDUL. Para mim, é uma grande fonte de sossego ver como, em geral, os estudantes da Nova SOL se tendem a dar bem. Pelo menos não temos este tipo de coisas. Não estou a dizer que as coisas são sempre fáceis… há diferenças e tal mas tanto quanto sei a regra é de entreajuda e não de sabotagem recíproca.”


MLB: “E hoje se não fosse estudar Direito (pelo menos na FDUL não ia (entre risos)) que curso ia tirar?”


FBB: “Se não fosse Direito? Neste momento, se me despedisse e fosse tirar uma outra licenciatura? Eu acho que sempre tive aquela veia de Humanidades, que acabei por não explorar tanto, que eu adolescente quis, portanto, acho que, talvez Clássicas. Isso ou Língua e Literatura Italiana. Algo do género. Eu, em geral, sempre gostei muito de línguas. Aliás, não sou o único aqui, entre os professores. Não sei se têm uma noção de como é que os professores comunicam entre si? Estou a falar de professores italianos e de professores que não são italianos, como é o meu caso e do professor Lúcio. Geralmente, eu e o professor Fabrizio, como nos conhecemos há bastante tempo, falávamos em inglês antigamente, mas cada vez mais o professor Fabrizio e os outros professores italianos têm insistido para que falemos em português, o que acho que é um sinal muito positivo da sua integração e acho que temos todos de estar gratos por esse esforço e por os termos connosco.”


MCR: “Estamos em culturas… por isso, qual é o seu destino de sonho, de férias?”


FBB: “Índia. Já viajei para a Ásia. Fui a um sítio na Ásia e foi a minha viagem, de longe, preferida. E não sei se me vai meter em apuros mas foi ao Irão. No contexto atual do conflito é complicado. Mas gostei da comida, as pessoas são super generosas, super acolhedoras, a arquitetura e a cultura são inacreditáveis. Eu tive a sorte de viver em Florença, que é uma cidade muito bonita. Lisboa é uma cidade muito bonita, Paris é uma cidade muito bonita, Amesterdão é uma cidade muito bonita… destas cidades só não vivi em Paris… mas o Irão não fica atrás, de todo. O que me faz querer ir à India é o facto de haver uma ligação familiar, o meu avô era de Goa, mas para além disso, eu acho que a diversidade, a arquitetura de tantas épocas diferentes, as influências locais, persas, hindus, do Islão, a influência cristã… acho isso mesmo muito bonito. Mesmo a natureza é muito bonita, é um pais enorme e que eu gostava de visitar.”


MCR: “E dos sítios onde viveu, qual foi o seu favorito?”


FBB: “Florença. Bem, não contando com Lisboa, Florença. Porque, Florença foi uma cidade perfeita para a fase de vida em que eu estava, cheguei com 23 anos, eu comecei o Doutoramento muito novo, e passei quatro anos e meio depois disso em Florença. Ora, vocês têm menos 4 anos do que isso, certo? Portanto, acho que podem imaginar o que é que fariam numa cidade como Florença, com essa idade, tendo quatro anos e meio pela frente, uma bolsa relativamente generosa. Bom, tive muitas saídas, muita exploração de Florença pela madrugada.”


MCR: “Tem alguma história louca?”


FBB: “De Florença? Bom, ter teria mas têm quase todas bola vermelha. Talvez haja uma e talvez vos surpreenda. Como eu vos disse, não fui um estudante ultra feliz na FDUL, fiz alguns amigos mas não passava muito tempo na faculdade, por exemplo nas Festas da Cerveja (o professor fez um parênteses na conversa para dizer que conhece a pessoa que criou o conceito das Festas da Cerveja e aparentemente essa pessoa arrepende-se profundamente de ter o ter criado), também não ia ao final de tarde do bar da faculdade, que tem happy hour… mas eu acho que nesse período, a minha vida de estudante não foi tão intensiva como a de muitos colegas. Muitas das atividades não me atraíam especialmente, mas para além disso, eu morava fora de Lisboa e demorava ainda um bocado a ir e voltar e portanto também acabava por não ir tanto. Acabei por ter uma vida social mais focada num grupo pequeno de pessoas. Em Florença, foi muito diferente. Em Florença… imaginem 400 doutorandos numa aldeia nos arredores de Florença, no meio das colinas, durante quatro anos e meio. Muito vinho, muita comida muito boa, muita cultura, muitas saídas à noite, muito estudo também obviamente. Mas tínhamos também um bar a sério na Universidade, é possível que eu e o professor Fabrizio, de vez em quando passássemos lá algum tempo… é possível que nos lembremos de tudo… ou não… Mas, quanto à história curiosa (e vou-me arrepender de a partilhar), um dos meus melhores amigos era inglês e num dia em que eu estava com especiais dúvidas em relação ao futuro, o meu amigo disse que me ia fazer uma pergunta à qual eu tinha mesmo de dizer que sim, e que era para me deixar mais em paz. A pergunta era “Aceitas fazer uma peregrinação por todos os bares irlandeses de Florença comigo desde as 7 da tarde até amanhã às 7 da manhã?”. Acabei a dizer que sim. Eu, de facto, nessa noite, e eu lembro-me da maior parte, bebi uma half pint de Guiness por cada um dos bares irlandeses. E cheguei a casa às 7, quase em ponto.”


MLB: “Nessa altura, portanto, as “peregrinações” eram um hobbie… e agora, quais são os seus hobbies?”


FBB: “Atualmente, gosto bastante de ler poesia. Eu já leio muito para a preparação das aulas e isto vai ser um bocado desconfortável de admitir (ou podem achar que me considero um grande intelectual, e não sou) mas muitas vezes não tenho tempo para ler romances. Ou se há períodos de grande trabalho, eu não consigo fazer o seguimento do enredo, e acabo por desistir do romance. Tenho um poeta preferido, acho que já o mencionei aqui no Jur.nal no Mergulho Profilático.”

 

A Maria Castro Ribeiro introduz o segmento onde pede ao professor Filipe Brito Bastos que associe bebidas alcoólicas a princípios constitucionais.


cerveja

FBB: “Estado de Direito, porque dá com tudo. Conhece muitos pratos à refeição que não caiam bem com cerveja? Em rigor, eu nem sou um fã enorme de cerveja portuguesa. E não estou sozinho nisto. Há aquela discussão filosófica: Sagres ou Super Bock. São as duas…

MCR: “Terríveis?”

FBB: “Palavra sua, eu teria usado outra, muito pior.”

martini

FBB: “Iniciativa económica privada, porque tem classe.”

MLB: “Foi o take cancelável.”


               vinho rosé

FBB: “Pois… assim à tabela, eu diria o princípio da legalidade administrativa, porque é algo que se pode consumir numa tarde quente de verão na praia. Vocês não lêm Direito Administrativo no verão? Na verdade, como nós precisamos de ler tanto para as aulas, eu não consigo ler só Direito em casa. Muitas vezes leio em cafés, jardins e sim, já li na praia.”


               vinho tinto

FBB: “Vinho tinto? Ação popular porque é uma grande produção portuguesa.”


               vinho branco

FBB: “Vinho branco… eu dira o artigo que define o território nacional, porque lá se incluem os mares portugueses, onde há muito peixe e o vinho branco vai bem com peixe.”


               vodka

FBB: “Vodka? Esta é difícil, muito difícil. O princípio da igualdade, porque o vodka afeta todos quase por igual.”

 

A Maria Leonor Baptista introduz o segmento seguinte onde pede ao professor Filipe Brito Bastos que explique certas declarações que proferiu na rede social Twitter, agora X…

MLB: “Primeiramente, o professor mencionou que Lisboa é a sua cidade preferida… mas acha que isso é compatível com o fedor que se sente em Lisboa…?”

 

MLB: “Professor, é sobre o professor Miguel Moura que estava a falar neste tweet?”


FBB: “Não, de modo algum. O professor Miguel Moura é um homem com muita classe. Estava a dirigir-me às pessoas que vejo no meu ginásio às sextas-feiras e é uma demografia de idades e de vocabulário bastante específica. Há várias culturas dentro do ginásio. Eu tenho uma personal trainer. Não tenho remédio. Eu, com a licenciatura, mestrado e doutoramento, infelizmente, com má postura, fui desenvolvendo problemas de costas e não sou o único com esta condição. Isso afeta todos os docentes. São ossos do ofício. Uma das coisas que ajuda muito é exercício físico e apercebi-me que, para não ficar pior, o exercício e a personal trainer me fazem muito melhor.”

 

MLB: “Depois, temos aqui um tweet em que gostávamos mesmo que nos explicasse do que é que está a falar… porque pelo enunciado não conseguimos mesmo perceber.”

 

FBB: “Isto são pastéis de nata. E tanta descrição… porque há uma forma correta de fazer as coisas.”


MLB: “Mas como é que isto afeta o princípio da liberdade?”


FBB: “Algumas verdades não são relativas. Há uma verdade absoluta sobre o consumo dos pastéis de nata. Próxima pergunta! Mas… isto não me incomoda, eu aceito os gostos das pessoas mas também é importante a ordem pública. E o pastel de nata está acima da liberdade individual. Mas há ocasiões em que eu me esqueço de que os meus alunos veem as coisas que eu coloco online. Estou muito próximo de deixar de ter X, porque parece uma máquina de pôr coisas frustradas, infelizes e com raiva.”


MLB: “Concorda com a ideia de que existe uma cultura de cancelamento perpetuada nas redes sociais?”


FBB: “Sabe, eu acho que a cultura de cancelamento existe há muito tempo, pelo lado ideológico. Eu ainda sou do tempo em que existiam cancelamentos… enfim, pressões para que não se realizassem eventos de cariz mais progressista. E agora, quando falamos em cultura de cancelamento, estamos mais a falar de estudantes, em universidades que quando observam uma opinião de que não gostam, atacam. Para começar, acho que, em geral, o que é descrito como cultura de cancelamento, não é mais do que exercício de liberdade de expressão do outro lado, de quem não concorda, que é igualmente importante. E, por outro lado, parece-me que em Direito, pelo menos, tendemos a conseguir manter uma cultura em que aceitamos que outros possam ter opiniões diferentes. Apesar de, hoje em dia, ser mais difícil ter certo tipo de discussões nas aulas, do que há 10 anos. Eu acho que a polarização em geral, de que o X se tem tornado um instrumento, tem contribuído para isso, para vermos as coisas só a preto e branco.”


MLB: “Mas o X também tem coisas boas… serve para dar conselhos aos seus alunos.” 


MLB: “Professor, aqui também não há liberdade de escolher a resposta a dar numa entrevista de emprego?”


FBB: “As pessoas têm toda a liberdade de sabotarem as suas próprias entrevistas de emprego. Eu, uma vez, fiz parte de um júri, como dirigente associativo em Florença, em representação dos estudantes no processo de recrutamento do novo Diretor. Como podem ver, uma Universidade com um determinado espírito democrático, e muito interesse nalgumas coisas. E juro-vos que, todos os candidatos deram todos esta resposta do “Sou muito impaciente para ver resultados.”. No fundo, é um não defeito. Significa apenas que sou uma pessoa ansiosa e produtiva. Mas enfim, às vezes, as pessoas erradamente em entrevistas caem neste erro ao falar no seu pior defeito. Não sejam ingénuos.”


MCR: “E qual é o seu maior defeito?”


FBB: “Sou muito impaciente para ver resultados. Não, agora a sério. O meu pior defeito… é para aparvalhar ou ajudar os estudantes?”


MLB: “Não, para ajudar os estudantes é o seu Twitter, professor.”


FBB: “Eu sei. Se a pergunta é séria… Síndrome de Impostor. Como académico, como investigador…”


MLB: “Como amigo também sente?”


FBB: “Como amigo?”


MLB: “Sim, nas relações pessoais. A minha pergunta vem de um sítio de, num grupo de amigos onde estão todos a discutir cultura, política… às vezes não sente que ter amigos tão “fixes” o faz pensar?”


FBB: “Estou a perceber… se o que quer dizer é o olhar à minha volta e ver que estou rodeado de pessoas com imenso talento e de uma inteligência enorme, altamente produtivas e que conseguem ter uma vida cultural, social muitíssimo mais enriquecedora do que a minha e me pergunto como é que conseguem? Então sim, absolutamente. Eu acho que muitos de vocês têm também. E acho que em particular há uma grande diferença entre a Nova e a Clássica. Na Clássica, sendo algo inconsciente, convive-se bem demais com a Síndrome de Impostor e com o normalizar da Síndrome de Impostor como uma característica intrínseca do bom estudante ou do bom professor. Só és bom estudante se te achares incompetente como ponto de partido. E aqui, acho que não temos tanto isso.. E faço um esforço para tirar os estudantes da zona de conforto precisamente por isso, para irem mais além.”


MCR: “E sente que este é um sentimento partilhado na academia?”


FBB: “Pelos professores? O pior professor é aquele que não tem Síndrome de Impostor.”

MLB: “Mas aí está a perpetuar.”


FBB: “Estão a rir? Os piores professores são aqueles que são vaidosos demais para reconhecerem as suas imperfeições como investigadores. Também há um extremo oposto que é, muitas vezes, ensinamos coisas que pensamos ser um desastre, muitas vezes eu saio de aulas a pensar que fui péssimo e que expliquei tudo muito mal. Do mesmo modo, o meu artigo mais bem citado, foi um que estive quase para não publicar, por achar que era uma perda de tempo.”

 

MLB: “Professor, tem dado muitos conselhos aos seus alunos nesta entrevista, mas a questão é de quem é que gosta mais, dos seus alunos ou do senhor que passa música no metro?”


FBB: “Eu já sei o que vem aí…”

 


FBB: “Gosto mais dos alunos… E apercebo-me de que tenho formas diferentes de interagir com alunos que sei terem maneiras de agir e sentidos de humor diferentes. Acho piada, por exemplo, ao facto de poder fazer indiretas sobre petições nas aulas e ver pessoas a rirem-se, ou então, referir que sei quem vai ficar a rir por último (em referência ao sticker).”


MLB: “O professor usa os seus próprios stickers?”


FBB: “Às vezes. Um em particular. Aquele do “Até me emocionei”. Isto circulou até fora da faculdade. E eu acho bastante piada. Embora, este em particular seja um bocadinho cruel, porque, foi uma aula de dúvidas dada a um fim de semana e eu estava com uma conjuntivite ou algo do género. Portanto, estarem a fazer troça de alguém que estando incapacitado deu uma aula de dúvidas ao fim de semana… acham bem?”


MLB: “É o princípio da liberdade a funcionar…”


FBB: “Há um sticker em que a autora se esqueceu de censurar o seu nome. Acho engraçado os stickers, sim senhora. Acho piada. É uma forma de os alunos se meterem com os professores. E dos professores se meterem com os alunos- evil FBB. (sim, o professor disse isto)


MCR: “Acho que o professor é um professor atento às dinâmicas entre os alunos.”


FBB: “Na medida do apropriado e do que me interessar, claro. Mas eu gosto de saber se os meus estudantes se sentem bem, por alto, não me interessam os detalhes. E se conseguimos fazer um bocado de humor e de auto-ironia todos nós, se não nos levamos demasiado a sério, acho que é uma forma simpática de convivermos.”

 

A Maria Leonor Baptista introduz o último segmento da entrevista onde pede ao professor Filipe Brito Bastos quick-fire answers. Não foi muito fácil…

 

Qual é a figura pública que mais o irrita?

FBB: “O Eurico Brilhante Dias. É uma pessoa de quem posso dizer que nunca ouvi dizer uma coisa que não fosse ou cretina ou mentirosa, ou ambas. Há um pior ainda. O Gabriel Mithá Guerreiro. Para começar tem uma vozinha… Depois, porque faz parte de um segmento de pessoas que se querem entender como intelectuais de direita radical. O livro dele é, de longe, o livro mais reacionário que eu tenho na minha biblioteca, porque o comprei sem saber o conteúdo. Vi apenas que era um livro de história, e li e era um festival de disparates e de manipulações de factos históricos. E ele faz tudo isso dando-se a si mesmo uma autoridade ridícula por ser académico. Eu acho que há um lugar no inferno reservado para académicos que puxam dos galões desnecessariamente…”


Preferia que existissem 3 ou 30 ministérios?

FBB: “Preferia 30. Porque, com 3 ministros, apenas, ninguém consegue.”


Que ministério implementaria que ainda não houve?

FBB: “Ministério do Ensino Superior. Mas que ainda não houve mesmo, ministério da Regulação, separado da Economia. Pelo simples facto de haver muito comum, nas várias áreas da Regulação. Outro ministério que deveria existir, e não sei se já houve algum com este título especificamente, Integração Social ou Inclusão. Nós tendemos a pensar muito em categorias de pessoas como estando em risco de discriminação, e é verdade. A minha única dificuldade com essa forma de pensar… aliás, são duas. A primeira é que parte do pressuposto que somos todos oprimidos ou opressores e não somos. Muitas vezes, mesmo os oprimidos são opressores de outros, para começar. E em segundo lugar, porque o foco que damos a determinadas categorias de pessoas que são discriminadas acaba por negligenciar que todos nós podemos ser discriminados ou sofrer na vida por pertencermos a categorias diferentes ou mesmo atípicas. As pessoas, por exemplo, com problemas de saúde mental não deveriam ser uma categoria tão respeitada nas suas necessidades de inclusão como outras? Ou então, por exemplo, cuidadores. Não digo apenas mães, digo cuidadores. Há casos de homens, que conheço, que cuidam das suas esposas com deficiências e que, no resto da sua vida, são vistos como pessoas, pura e simplesmente, homens privilegiados porque são homens, de classe média alta, mas as pessoas muitas vezes não sabem que dentro da vida privada de uma pessoa vai um desafio emocional. Isto já foi um resmuganço…”


Ananás na pizza, sim ou não?

FBB: “Eu vivi em Itália! Eu literalmente antes de encomendar uma pizza vejo se serve pizzas com ananás. Se servir, eu não encomendo pizza daí. Fiquei chocado com a pergunta! Gosta dos seus cereais com ou sem bebés mortos? Que pergunta horrorosa! Em Lisboa, há um consenso crescente entre os professores italianos… Santa Clara é uma pizzaria absolutamente extraordinária.”


Qual é o seu filme preferido?

FBB: “Pulp Fiction. Mas há séries que são melhores que filmes. Sopranos, a melhor série de sempre. Deviam ver. É uma série que seria impensável hoje, devido aos seus conteúdos ofensivos, que é extremo mas o enredo e a subtileza… não é apenas violência. O meu top de séries seria Sopranos, Breaking Bad, Game of Thrones. E numa fase da minha vida, Suits. Mas acho que é uma série muito pouco adequada para pessoas com Síndrome de Impostor. Aquilo causava-me ansiedade a certo ponto. No período em que estava a dar aulas e no escritório, foi-me demasiado. Agora, os dramas de sociedades são muito verdade. Sócios a envolverem-se uns com os outros… casos secretos… Eu não vivi isso, atenção! Quero deixar isso muito explícito, se algum anterior empregador meu ler isto. Outra coisa que reflete a realidade é que os grandes escritórios são uma aliança entre nerds e pessoas que se mexem muito bem.”


Qual é o nome que nunca daria a um filho ou filha?

FBB: “Há uma razão para os casos práticos terem sempre nomes tão abstrusos. Para não ofender ninguém. Com todo o respeito, eu seria incapaz de dar o nome João Maria a um filho. Acho demasiado beto. Desculpe, João Maria da tuna. A raparigas, pelo mesmo motivo, acho que Benedita, neste momento. Salvador também, a mesma coisa. Depois… hoje em dia, vejo jovens com o nome Pilar, por exemplo, e que já não são tão queques.”


Quantos livros já leu este ano?

FBB: “Muito poucos, infelizmente. Que não de Direito, óbvio. Eu acho que li apenas 1 romance inteiro e fui lendo muita poesia. Abro um livro de poesia, leio um pouco e volto a fechar o livro. O romance que li foi a “Cidade e o Mundo”.”


Qual é o melhor supermercado?

FBB: “O LIDL. A história extraordinária do LIDL…”


MLB: “Passou de nicho a mainstream.”


FBB: “Começa por ser uma coisa low cost mas com qualidade razoável e hoje, em dia, tem uma ótima qualidade. E agora, quase todos os dias, quase dia sim dia não, passo pelo LIDL do Bairro Azul e compro os meus lanches.”


Maior fobia e porquê?

FBB: “Cobras. De longe. Porquê a fobia de cobras? Porque é que uma pessoa tem de explicar a sua fobia?! Por definição, é irracional.”


Se tivesse de viver a vida de qualquer pessoa desta faculdade quem é que escolhia?

(depois de uma pausa dramática do professor FBB, que com certeza queria apenas atrasar o fim da entrevista)

FBB: “Ahm… Isto é muito difícil. Eu diria a professora Vera Lúcia Raposo.”

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