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- Não sou como tu, não somos iguais
Não sou como tu, não somos iguais. Já estás assente na tua pedra enquanto eu procuro a minha, então não me dites direções que apenas coordenam o teu caminho e não o meu. Não sou como tu, não somos iguais. Reconheço-te a grandiosidade, mas não a cobiço, não a desejo. Deixo-a para ti, porque apenas TU sabes lidar com tamanha luminosidade, pois, se ma desses, não saberia lidar, não por não ser capaz, mas por não ser a minha luz a agarrar. E por isso amo-te, amo-te por te reconhecer a luz que te ilumina e a luz que te falta. E se assim não fosse não te amaria, apenas te idolatraria. Não te idolatro, nem te venero, apenas te reconheço e te amo. Mas como disse não sou como tu, não somos iguais. Então não me mistures com os teus ideais, não sou a tua luz ainda que me ilumines, não sou tua ainda que me guies. Apenas passo por ti reconhecendo e apreciando a luz que, agora, me dás. E és hipócrita por pensar que só tu sabes o meu caminho e eu sou hipócrita por achar que já o sei. Não o sei, mas vou alcançá-lo, mas para isso… dá-me o espaço que eu te dou ao invés de o invadires. Não és o maior e eu também certamente não sou, então não me preenchas com o teu ego que apenas serve para te cegar de entender que, de facto, não sou como tu e que não somos iguais. Dá-me espaço e deixa-me crescer, porque tu já encontraste o teu espaço. Posso não ser como tu e podemos não ser iguais, mas isso não faz de ti sabedor mesmo que já saibas onde estás, apenas faz de ti uma luz que já sabe do seu lugar. Mas lembra-te... estrelas cadentes ainda são estrelas mesmo sem terem o seu lugar. E sei que faz de mim uma hipócrita achar que estamos no mesmo patamar, mas não confundas a minha hipocrisia com não saber pensar. Eu sei onde estás e sei onde EU quero chegar. Então lembra-te, não sou como tu, não somos iguais. Eu interrompo-te e tu interrompes-me. Mas amo-te e amo-te mais do que possas imaginar. Amo-te até doer, mas não quero ser como és, perdoa-me, mas não quero. Retiro o que reconheço como valioso, mas naquilo em que falhas (porque sim, tens falhas) vou ser melhor. E amo-te com falhas e amo-te com defeitos, se não os reconhecesse em ti não te amaria, não te amaria de facto. Acho-me hipócrita, mas sinto-te hipócrita, pedes e exiges de mim um nível de compreensão que ainda não me é capaz, mas não cumpres com aquilo que já supostamente deverias dominar. Não justifico os meus atos por achá-los corretos, ainda que eu mesma encontre neles uma razão honesta. Sim, sou de facto explosiva, sim sou de facto bruta, mas, talvez não te custe pensar que todo o meu molde surge da atmosfera em que me criaste. Não sei o que esperas de mim, se toda a minha vida não me deste espaço de ser sensível, nem criaste um espaço onde fosse seguro eu ser como sou sem este meu modo explosivo e bruto. E sim, a atmosfera molda-me, mas são as minhas ações que ditam o meu caráter e são os meus pensamentos que ditam os meus ideais. Não és tu, nem ninguém que me obrigam a ser quem sou, mas reconhece pelo menos o dedo que tens na resolução de pessoa que em parte sou. Não somos iguais (deus me livre de o sermos) se te fosse um clone, não seria alguém, não seria tua também... E fazer parte do teu ego não implica que tenha de ser como tu, mas sim em parte, melhor que tu. Hoje não me ouves, mas amanhã ouvirás. Não sou como tu e não somos iguais. Apenas espero que me ames, ainda que seja com diferentes ideais.
- doçura cortante
Nunca provei mel. Nunca diretamente do pote, nunca com uma colher, nunca na ponta dos dedos. Mel sempre esteve barrado em excesso sob cacos de um pote de vidro, no chão da minha casa de banho. Pote de vidro esse que, depois de ter insistido ficar cerrado à força das minhas mãos desesperadas, caiu no azulejo e criou uma pintura semelhante às de Kandinsky. Pego nos pedaços maiores daquela mistura contranatura, para tentar reter o maior doce possível nas minhas papilas gustativas, mas fico com a língua em sangue imediatamente após a primeira lambidela. Acabo por provar o meu próprio sangue, por diluir a saliva que me resta na textura do vidro. Nunca provei mel. O mel que eu melhor conheço está no fundo da arma com que disparo um tiro no meu pé direito. Só depois de soltar a bala, no único alvo possível, é que ele escorre. Pinga para o chão que piso, e ainda assim, tento deitar-me de barriga para baixo, e lamber o que consigo. Torno a minha casa de banho um local de crime horripilantemente açucarado. Há dias sonhei que tinha provado um dióspiro sem fios. Que tinha vindo parar ao meu prato a fruta perfeita. Que podia abri-la, desfia-la, tirar uma colher da gaveta e espeta-la no seu interior carnudo e alaranjado. Levar à boca e perder-me. Sonhei que estava ali mesmo, à minha frente, que bastava arrastar a cadeira para mais perto e pegar-lhe. Riscar o chão de madeira com os pés da cadeira, para alcançar a perfeição. Espernear-me, inclinar-me para a frente e para trás para tentar ganhar balanço. A cadeira não é o baloiço do parque infantil, fico sempiternamente estagnada na iminência de estar tão perto, mas tão longe. Ver trilhos e trilhos de tentativas nas tábuas de madeira que piso e repiso, em vão de me aproximar da mesa. Reparar na quantidade de linhas aos zigue-zagues que tenho em volta das meias às riscas, e perceber que já tentei todas as combinações e que talvez precise de alguém para empurrar as costas da cadeira em que me sento. Juro partilhar o dióspiro. Hoje, a cama abraçou-me com mais força, desde o amanhecer ao anoitecer. Fiquei presa no conforto, sem coragem de dele sair. Tive direito a piedade e empatia, e jantar levado num tabuleiro. Tinha esparguete com bastante cenoura, raspada das profundezas do tacho de propósito para mim. Tinha uma taça com banana cortada e outra com uma pera rocha fatiada, da mais rija. Tinha amor em cada pedaço de vidro amolecido. Tive um conforto maior no coração, do que em todo o corpo, que repousava na cama desde o dia anterior. Quem me arranjou o tabuleiro queria que eu provasse mel. Sabe bem saber que há quem saiba o que me sabe bem. Nunca provei mel. Mas uma vez, ao andar à chuva com a pessoa que mais admirava, vi como as gotas de água se depositavam nas suas pestanas, e como, distraída, pouco ou nada se importava com o facto de dar casa à chuva foragida das nuvens, do conforto de uma almofada fofinha. Os seus olhos eram os mais bonitos que eu alguma vez tinha visto, tanto que me lembro de invejar a posição daquelas partículas alcalinas. Falávamos sobre o que faríamos mal viesse o verão, porém, eu dava tudo para estarmos impotentemente presos a um inverno chuvoso. Ali, naquela calçada escorregadia, e com um corpo caminhante a meu lado, jurei ter provado um pingo de mel.
- Qualquer semelhança com a realidade é simplesmente acidental
Suponhamos, por razões meramente recreativas, que num dia aleatório, tive uma aula da cadeira X com um professor Y. - quem nunca o supôs, que atire a primeira pedra. Depois de um elegante atraso de 7 minutos - quase ao nível de uma Elizabeth Taylor a chegar propositadamente atrasada ao próprio funeral - Y entrou na sala, lamentando 168 vezes pela demora. Qual fora a causa do atraso? Talvez um problema pessoal ou, porventura, uma avaria no carro? Ninguém sabia. Permaneceu o mistério. Tendo enfrentado alguns problemas técnicos (um misto entre uma trágica mudança de cabos e um tedioso projetor anómalo), Y teve de recorrer à prestável ajuda técnica que, como David defrontou Golias, resolveu o problema herculeamente retirando um cabo que estava incorretamente posicionado. Já com o equipamento efetivamente pronto, Y estava agora pronto para começar a aula de X. Nos primeiros 20 minutos, Y parece perder-se na emoção do mundo dos camiões, referindo todos os aspectos divertidos que lhe são inerentes (dos fabulosos preços aos míticos cartéis de camiões). De seguida, achando os alunos ingénuos que iam de facto fazer exercícios da cadeira X, o nosso caro Y inicia uma elucidação deslumbrante sobre o pensamento “fora da caixa”, - uma expressão que me traz uma repulsa física - estando acompanhado por um diagrama aparentemente muito importante. Inevitavelmente (para Y é sem dúvida inevitavelmente), a conversa leva-o a um mistério do detetive britânico Sherlock Holmes. Percebendo agora toda a importância de pensar “fora da caixa” (quer seja para resolver um mistério de um cavalo furtado ou para a vida em geral), Y lança uma pergunta para o ar: “o que é que estamos aqui a fazer?”. Pois, amigo, não faço a mínima ideia. Sem dar resposta à pergunta por si mesmo lançada, avança abruptamente, dizendo com uma certa voracidade a palavra “térmitas”, acrescentando que íamos agora, por fim, “estudar o mundo das térmitas”. O ânimo no rosto dos alunos era simplesmente inexplicável (ou inexistente, caberá a dedução ao leitor). Depois da entusiasmante exposição sobre o mundo das térmitas e da sua ligação à arquitetura, Y inicia uma explicação sobre a importância de trazer os nossos hobbies para o trabalho, dando o exemplo de uma colega que, a partir do momento em que trouxe o seu hobbie para o escritório, viu o seu desempenho melhorar drasticamente - suponho que, se os hobbies desta senhora fossem, por exemplo, o boxe ou o esqui, a situação seria ligeiramente diferente. Depois de outra exposição brilhante, já tendo passados 49 minutos do início da aula, Y afirma com assertividade “agora vamos ao que interessa”. Os alunos, mais uma vez ingénuos, pensaram que agora, efetivamente iam começar a fazer exercícios. Mas não. O divertido e interessante Y tinha outros planos. Passa o slide, com um certo suspense, e vemos, escrito a letras garrafais, a expressão “MODELOS MENTAIS”. De seguida, com o seu charme já característico, Y afirma: “não sei se gostam da história da aviação”. Momentos depois, lá estava ele, todo contente, a explicar toda a história da aviação, incluindo o famoso Princípio de Bernoulli, chegando até a mostrar um slide com um desenho a explicar o funcionamento de uma asa (sendo a termodinâmica um assunto fundamental para um aluno de direito, como todos sabem). Com um sorriso na cara, Y lamenta que tinha um “slide de medicina”, mas que decidiu tirar, visto que achou serem “muitos slides”. Muitos slides, caro Y? Suponho que o nosso meigo Y não conheça o termo “muitos”, dado que, anteriormente, mostrara 247 slides sobre a termodinâmica, mas adiante… Querendo dar à aula um cheirinho dos Current Affairs, o versátil Y inicia uma explanação sobre o controverso “Pacote Mais Habitação”, coisa que imediatamente fez torcer o nariz dos neo-liberais no local. De seguida, os alunos tiveram a sorte de ouvir uma “breve” exposição (de 17 minutos) sobre os “five whys” (tendo passado por histórias divertidas sobre Jeff Bezos e sobre o Lincoln Memorial). A 20 minutos do final da aula, Y pergunta se alguém sabia o que eram biónicos. “Ufa” pensei eu “ao menos há pessoas que sabem… Não estava para ouvir outra história sobre biónicos.” Que tolo que sou. Sim, ouvimos mais histórias sobre biónicos e sobre legos e sobre cavalos a comerem cenouras e sobre outras coisas decerto fundamentais para o futuro. “No próximo dia, vamos falar de criatividade”, diz calorosamente o nosso gentil e afável Y. Aguardarei. A aula era de quê? Pois, eis a questão. Até para semana
- Onde almas se perdem
Naquele dia fui à praia. Não foi planeado, não tinha qualquer esperança de ver o mar, as suas ondas que agitam a alma e o som delas que acalma os dias mais turbulentos. Não estava calor, mas o brilho do sol justificava a tentativa. Foi de estranhar, especialmente considerando que dias antes estivera numa praia vizinha, repleta de águas calmas onde, apesar das esperanças que flutuavam em cada onda mal arrebentada, no fundo dos seus mais profundos mares, encontravam-se as mentiras enterradas. Um dia tentei visitar essa costa distante, para recordar aquilo que no passado tive medo de conhecer. Corri o risco. Mas o risco é que acabou de correr com pedaços meus e levá-los para onde jamais os reencontraria. Mas, se a vida é feita de riscos, deixaria aquela praia fazer-me perder o amor por cada onda agitada, por cada sensação que sentia ao tocar naquela areia suave? Não seria isso perder o amor por amar? Desta forma, naquela quarta-feira 13, decidi colocar os pés na beira-mar novamente. Numa areia diferente, desconhecida. Estava receosa no início, até disse para mim mesma para dar cada passo calmamente de forma a não me magoar. Mas, assim que te afeiçoas a algo diferente, acreditas que finalmente encontras o lugar a que pertences. E que bom que foi, cada passo, cada corrida que fiz naquele areal. Neste não seria um “apesar”, mas sim “felizmente” que a areia fosse diferente. De facto, voltei lá todos os dias, e quando não estava lá só pensava no nervosismo que sentia por cada vez que a voltaria a ver. Mas era sempre tão bom. Até que, numa noite, tudo mudou. As ondas pareciam calmas de início, o céu estava limpo. Viam-se lindas estrelas, como que a formar uma linha para o horizonte, em direção ao além. Contudo, só se começa a ver a areia a estar cada vez mais próxima, e aquela água cada vez mais distante. Aquela areia que outrora gostara, que não me magoara, agora me feria a cada passo em direção à água que se afastava. Tentei saltar para evitar a dor, mas não valia a pena. A cada passo que dava, a cada sobressalto só sentia cada vez mais os picos, os vidros estilhaçados, as beatas a queimarem-me. Mas logo compreendi que, por cada passo que desse, a água nunca estaria mais perto de mim. Não valia a pena. A areia ficaria cada vez mais áspera, e a água cada vez mais distante. Não há nada a fazer. Na realidade, aquele litoral que outrora amei encheu-se da areia que noutros tempos cuidou de mim, e o mar cada vez mais calmo, mais calado, já não era algo radiante. Na realidade, era um tsunami, para o qual a única saída seria perder a esperança de voltar a qualquer dia pisar uma praia.
- não somos bem
Não somos bem amor. Ele gosta de chamar-me pelo nome e contar-me sobre o dia dele. Eu gosto de me levantar cedo, às vezes às horas a que ele se deita para dormir. É para ele que ligo quando sou eu a deitar-me tarde. Com ele, não sei discutir. Sei ouvir, fico sentada ali e quero absorver tudo. Não pressiono, só espero saber um pouco mais. Ser um pouco mais. Nunca o digo em voz alta, mas às vezes penso nele antes de dormir. Às vezes não vou dormir logo, mas ele também não liga. É estranho como não quero mais nada. Basta-me estar perto, ouvir a voz dele. Saber que se vai sentar comigo um pouco e que me vai dar o lugar de dentro do passeio. Fico tímida e não sou bem eu. Estou a pairar por uns instantes, e quero ficar irritada, gritar-lhe mas não sou assim. Esta presença basta-me. É mais platónico do que poético. É mais privado do que prosa. Mas é muito menos. Afinal, não somos bem amor.
- das balas perdidas perdidas na guerra
Nunca me falaram de guerras até ter idade para as perceber. Ouvia falar da batalha x ou y, de quem as ganhava, de quem conquistava a terra. Ensinaram-me a invariável da guerra: que era para ganhar ou perder. Não precisei de me pôr em bicos de pés para ver o caixão branco. É uma memória sem qualquer sabor que guardo comigo e à qual volto para relembrar. Lembro-me de olhar para a minha mãe e de lhe perguntar “e agora?”, como a criança inocente que era. E ela respondeu-me secamente “a vida continua”. E eu fui, de lábio a tremer, abraçar a L. e repetir-lhe em tom de murmúrio “a vida continua”. Não me respondeu, e hoje em dia eu também não saberia o que responder. [ Desculpa, L.. Tenho consciência de que é injusto falar sobre isto. Mas tu também já não existes para me dizeres isso. Quem me dera que o dissesses. ]. Foi nesse momento que me apercebi do verdadeiro significado de guerra sem ter de procurar pelo sentido etimológico da palavra. A partir daí fiz a minha coleção de cartas e vi outros a fazerem a sua. É uma narrativa melancolicamente bonita, mas que sempre me soube mal na boca. Ver-me a mim e aos outros a pintar quadros de romantismo, em telas gastas e com pincéis usados, para depois chorar lágrimas secas porque temos todos mãos destreinadas [ tenho tendência para pintar com a mão esquerda sem ser canhota ]. Resta-me pôr-me em bicos de pés e oferecer o ombro e um abraço, mesmo tendo estado no mesmo lugar, horas antes, a extravasar a cabeça e o coração, e repetir a cantiga que me embala os dois: a vida continua. “O mundo não é só isto, o mundo é tanta coisa!”. “Mas o mundo grita-me aos ouvidos e eu sofro de surdez crónica.” Pergunto-me constantemente se as guerras são para ganhar, perder ou apenas sobreviver. Rendo-me sempre ao responder pela ignorância. Ninguém tem respostas para tudo [ e está tudo bem com isso ]. Mas é uma verdade amarga de que, na maioria delas, tudo o que se pode fazer é sobreviver. Não há sentido ou razão inerente ao ato de disparar numa guerra. Talvez seja porque o barulho à volta se torna ensurdecedor e só queremos que ele faça silêncio. “Nunca quis cravar-te uma bala na carne, perdoa-me, até peguei na arma sem querer”. Está tudo bem, asseguro que está tudo bem, porque a voz falha e o cansaço ganha. E no meio do caos estupidamente excessivo, apercebo-me de que ninguém me falou das balas que se perdem pelo caminho. Falam-me das que acertam no peito ou numa perna, das que matam e das que ferem, mas nunca souberam aproximar-se e sussurrar-me ao ouvido “em todas as guerras há pelo menos uma bala disparada em vão. Ou várias. Mas há sempre uma que se perde pelo caminho.”
- Nota de Imprensa - Manifestação Nacional Academia não Assedia
Aos órgãos da comunicação social agradecemos a divulgação da seguinte NOTA DE IMPRENSA MANIFESTAÇÃO NACIONAL ACADEMIA NÃO ASSEDIA 7 de novembro – 18h00 O assédio no meio académico dura há demasiado tempo e com a complacência da comunidade académica, sendo que o assédio não tem lugar nas nossas universidades, e infelizmente, esta prática está sistematizada e institucionalizada. Os números não nos surpreendem. De acordo com um estudo realizado pela Universidade de Évora concluiu-se que mais de um terço dos discentes do ensino superior já sofreu assédio sexual e metade de assédio moral. Nos últimos dois anos temos sabido inúmeros casos de assédio moral e sexual de norte a sul do país. No entanto, o corpo estudantil sabe que os casos que saem para fora e são divulgados pelas fontes mediáticas são residuais. Mais recentemente, tivemos casos de assédio na Universidade de Coimbra, que até então já receberam 42 queixas. Na Universidade do Minho, no final de 2021, foram registadas mais de 100 denúncias de assédio sexual. Na Universidade da Madeira os discentes falam de casos de assédio sexual e moral. Na Universidade de Aveiro tínhamos estudantes que reclamavam da faculdade ser cúmplice deste problema. O Instituto Superior Técnico registou mais de 300 estudantes que afirmaram que tinham sido alvo de assédio moral e quase 100 alvo de assédio sexual. Na FDUL, em 11 dias foram feitas cerca de 50 denúncias de assédio, relativas a 10% dos professores. O movimento Academia Não Assedia exige uma Academia segura e inclusiva, onde sejam efetuadas medidas eficazes para colmatar este problema. Com isto dito, o movimento irá realizar uma manifestação nacional no dia 7 de novembro, às 18h00, em vários pontos do país: Minho – Universidade do Minho, Campus de Gualtar (Prometeu); Porto – Universidade do Porto, em frente à reitoria; Coimbra – Praça de D. Dinis; Lisboa – Universidade de Lisboa, em frente à reitoria. Segue o link com o manifesto: https://ugc.production.linktr.ee/3cd08183-c300-4b84-b83c-7e60daa05a93_Manifesto---Academia-N-o-Assedia.pdf Redes sociais e contactos: Instagram: https://www.instagram.com/academianaoassedia/ Twitter: https://twitter.com/Anaoassedia E-mail: academianaoassedia@gmail.com Colocamo-nos ao dispor para prestar quaisquer esclarecimentos adicionais ou declarações sobre a Manifestação!
- mulheres a ministras - discurso
A, a primeira letra do abecedário, a primeira letra de muitos nomes, muitos nomes simples, ana, anabela, andreia…. aliyah. aliyah, o meu nome há vinte e um anos, tão simples quanto os outros, mas por vezes reduzido, amolgado e violentado. a minha identidade começa aqui, como me apresento ao mundo, e como tantas outras mulheres se apresentam muitas vezes invisibilizadas e oprimidas. Nas palavras da grada kilomba, a língua, por mais poética que possa ser, tem também uma dimensão política de criar, fixar e perpetuar relações de poder e de violência, pois cada palavra que usamos define o lugar de uma identidade. o apresentar ao mundo, define como somos percepcionadas, mas para muitas mulheres negras, nem com uns saltos, camisa ou blazer somos merecedoras de tal respeito. e no cabelo das pessoas negras? já pensaram? às vezes parece que não nos pertence, as vezes que pertence demais, é um símbolo de resistência e revolução, e de opressão e violência. tão bem conheço o cheiro a queimado do meu cabelo a tentar que ele fique liso, para caber dentro dos parâmetros ocidentais e da beleza comercial. não serei também eu mulher? esta provocação de bell hooks, sobre a qual teorizou o tratamento das mulheres negras vítimas da escravatura, que nos leva a pensar sobre os corpos das mulher negras que foi muitas vezes esquecido durante a luta pela emancipação das mulheres. os estereótipos atribuídos às mulheres, como seres hipersexuais e selvagens, justificou muitas vezes a violência que lhes era exercida, na perspetiva sexista e racista, não se poderia violar alguém que era uma selvagem sexual. não serei também eu mulher? quando exijo o mesmo respeito, a mesma dignidade e as mesmas oportunidades. não seremos todas mulheres? a emancipação das mulheres tem que se interseccional, não pode ser separada das questões económicas e não pode esconder-se na crítica ao capitalismo, a emancipação nos termos do patriarcado capitalista branco, não serve as mulheres negras, ciganas, imigrantes, trans, queer, nem as próprias mulheres brancas, nas palavras de audre lorde, não serei livre enquanto alguma mulher não o for. então onde estão as mulheres negras? a limpar as escolas, o parlamento, os ministérios, as casas dos ministros, a suportar a sociedade na qual vivemos. no fundo é esta a história que querem que seja das mulheres negras, são o cimento e a pedra que dão a estrutura ao sistema, são quem se inquieta e combate, são as que não são vistas, são as que não são escolhidas para ocupar lugares de destaque e poder, e quando os ocupam, são usadas e silenciadas, como um pin na lapela, um biombo na sala, um mero adereço. mas nós existimos, resistimos e reclamamos, estes espaços também são nossos, tantas que os ocupam, e esquecemos de as nomear, e todas elas tem nome e sobrenome, beatriz gomes dias, joacine katar moreira, romualda fernandes, francisca van dunem, cristina roldão, aurora almada, e tantas outras que não são a primeira nem a última, nem são as protagonistas políticas da nossa história mas que deixam o seu legado e contribuem diariamente para a sociedade. e quantas de nós conhecem a virgínia quaresma, georgina ribas, titina silá, josina machel, amelia araujo. Todas elas participaram na construção de uma sociedade que não as reconhece como delas, foi sobre os ombros destas mulheres que a esta sociedade foi construída. Elas pensaram, construíram e imaginaram lutas coletivas, onde todas, mas todas as mulheres fossem vistas, ouvidas, reconhecidas e lembradas. a luta feminista não pode obedecer a hierarquias que reproduzem o patriarcado, em que as mulheres negras são subalternizadas na luta. a sororidade, permite-nos chegar mais longe, e despatriarcalizar as nossas insittuições. de mulheres a ministras Já imaginaram um governo liderado por mulheres? onde existe uma primeira ministra, onde se pensa e constrói políticas públicas que combatem as múltiplas desigualdades a que as mulheres estão sujeitas, e apresentam soluções com impacto, onde combatem a feminização da pobreza. onde existe uma política de habitação pública que garanta uma casa para quem precisa, sobretudo para as famílias monoparentais, lideradas por mulheres, que muitas vezes são vítimas de violência doméstica, e que estas tenham o direito a uma casa e não o direito a ganhar uma casa na loteria dos concursos públicos. e tantas outras políticas públicas que podiam ser implementadas, mas vivemos num país que se recusa a conhecer a sua composição etnico-racial. como é que sabemos que as jovens negras vão para o ensino superior, como é que sabemos que as juízas negras estão nas altas instâncias dos tribunais, como é que sabemos a constituição das nossas prisões, como é que desenhamos políticas públicas sem saber onde criar e para quem criar mecanismos que garantam a mesma igualdade de oportunidades. eu imagino uma sociedade, onde as mulheres, sejam elas negras, imigrantes, trans, queer, estejam nas instituições de poder. e que estas instituições de poder, não continuem o ciclo de planos e projetos e recomendações que nunca são concretizadas. é da radical imaginação das mulheres negras que vos falo hoje, e que me permitem todos os dias levantar e continuar a lutar por um país melhor. e acabo com um poema da maya angelou: ‘’You may write me down in history With your bitter, twisted lies, You may trod me in the very dirt But still, like dust, I'll rise.’’
- Em frente
Ninguém quer morrer, mas feliz daquele que for em frente. Vai a dançar endurecido para o Inferno interessante, ou para o celeste aborrecido. Uma coisa é certa, para trás não fica sozinho a chorar, por quem está muito bem a descansar. Quem vai, acaba, deixa de se preocupar. Quem fica, trabalha, desamparado a lamuriar. Até a velha tralha do novo defunto o vivo desgraçado tem que arrumar. Vivam bem intensamente e nunca tenham medo de ter que ir em frente. Ide a cantar.
- As desilusões do ser
No que se deu a imaginação, a ânsia do isolamento, a fuga da verdade e o medo do amor? Incoerências. É incoerente que uma pessoa seja as duas coisas simultaneamente, como também, é incoerente que os sentimentos sejam a todo tempo, bipartidários. A praticidade demanda um eixo, somente um! Com aquarela, é sistematicamente delineado um espaço de pertencimento à sua categoria, queira o introspectivo encaixe-se nela ou não. Assim, não se dá a relevância às suas multifacetas, pequenas particularidades e excentricidades. É, de fato, o paralelo de uma única cura à uma nação, a terceirização do pertencimento particular na sociedade, a redução do Ego pelo Superego. No fim, se dá razão àqueles que a sanidade aparenta ser externalizada com mais eficiência; aqueles que admitem, por si próprios, serem os donos do Ego superior, os reis dos portões de ouro. O resto, no entanto, são supervisores que legitimam o poder dos outros e, é claro, os de si mesmos. O que se torna de nós? Como isto nos afeta? É, no fim, uma morte de nós mesmos. Uma morte de toda a capacidade de ação autêntica e do ato de desvencilhar dos medos, da libertação das emoções. É, justamente, a desistência de si, a legitimação dada a quem nos permite viver nas margens interiores aos portões, é a submissão. No entanto, onde se encaixa o amor? Quando a mente é deturpada por uma realidade fixa, que lhe causa angústias, pedaços que há de ficarem armazenados no local incorreto. Talvez o amor seja a cura, ou talvez não. Pode, no entanto, ser uma esperança, exatamente por ter a habilidade de evocar um mosaico de emoções. Talvez o oposto da morte não seja precisamente a vida, e sim, o amor, por si, pelo outro, de outros. Em cacos, a liberdade para amar e “desamar” é o escândalo íntimo da alma e o fogo modulador ; é o que eu quero ser, a cada vez, em uma melhor versão.
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